segunda-feira, 10 de julho de 2017

A República Popular da China sob a liderança de Mao Zedong e o início do governo de Deng Xiaoping

Em 1 de Outubro de 1949, vencida a guerra civil disputada entre nacionalistas e comunistas, é fundada a República Popular da China (R.P.C.). 

O Partido Comunista Chinês passa a governar mas encontram-se algumas linhas de continuidade entre o novo governo e o anterior sob a direcção do Kuomitang. Desde logo o autoritarismo - os dois partidos não eram tão diferentes assim, nomeadamente na organização, bastando lembrar que o PCC havia sido criado a partir do KMT. E o nacionalismo - ambos entendiam que se deveria atender a aspectos da cultura tradicional e não seguir cegamente o que vinha de fora. 


As ideias de alguma moderação a que se vinha assistindo antes de 1949, nomeadamente no período de Yan'an e na campanha de rectificação zhengfeng, perduraram nos primeiros anos da R.P.C., muito devido à necessidade de não antagonizar determinados sectores da sociedade que eram considerados importantes. Mao estava interessado em implementar o seu projecto de Nova Democracia com a ditadura das 4 classes: operária, camponesa, pequena burguesia urbana e burguesia nacional, no fundo, o povo liderado pela classe operária e pelo PCC.

A mobilização comunista era intensa, funcionado através do lançamento de inúmeras campanhas de massas, as quais serviam para introduzir novas políticas, mudar atitudes, rectificar más práticas e purgar inimigos de classe. Algumas destas campanhas foram a "resistência à América e apoio à Coreia", "supressão da contra-revolução", com apelos à denúncia por parte de familiares e amigos de indivíduos que pudessem agir contra os comunistas, e as campanhas "anti-corrupção", "anti-desperdício" e "anti-burocratismo", onde se promovia a denúncia de actividades consideradas perversas.  

Em termos económicos, em 1950 foi adoptada uma lei da reforma agrária que trazia a abolição do sistema da propriedade da terra de exploração feudal, ou seja, o confisco da terra aos terratenentes e camponeses ricos que não a cultivavam (teoricamente não haveria confisco aos ricos que trabalhavam a terra). As reacções foram negativas, com violência e denúncias. Em 1953 deu-se início à segunda fase da reforma agrária com o caminho da colectivização. Foram formadas equipas de entre-ajuda, grupos de famílias, sendo reunido trabalho, alfaias e animais. Para além da entre-ajuda foram criadas cooperativas de produção agrícola com disponibilização da terra e instrumentos. A propriedade privada não era abolida, era é para todos, e os rendimentos eram distribuídos de forma diferente, quer com base na terra quer no trabalho.

Para 1953 - 1957 foi estabelecido o Primeiro Plano Quinquenal. A ideia era de que até 1957 se iria conseguir realizar todo o esforço relativo às cooperativas agrícolas e à produção industrial, com a duplicação da produção industrial e a incorporação da indústria e do comércio em termos nacionais. Passa a falar-se de propriedade da terra colectiva. As cooperativas desenvolviam-se muito rapidamente, com aumento da produção agrícola, mas também artesanato, indústria e comércio, levando a que se falasse de "maré-alta" (ou "pequeno salto em frente"). A verdade, porém, é que não havia possibilidade de aumento da produção industrial, uma vez que o estado continuava deficitário e com dificuldade de se financiar, com falta de investimento e de matérias primas. Em alguns domínios havia excesso de produção, logo desperdício, e noutros escassez. Fome. Falou-se de uma maré alta ambiciosa e de período de implementação demasiado curto, um "avanço precipitado", nas palavras de Zhou Enlai. Mao acaba por recuar face a esta política.



Em 1956 é lançado o Movimento das Cem Flores e no ano seguinte o movimento anti-direita.
Também em 1957 é lançado o projecto que ficou conhecido como "O Grande Salto em Frente". O objectivo era o de ultrapassar a Grã-Bretanha em 15 anos. São lançadas campanhas de mobilização de massas, como projectos de conservação de água e eliminação das 4 pestes (moscas, mosquitos, ratos e pardais) - um futuro socialista utópico, uma sociedade onde a limpeza e higiene fossem a norma - e mobilização para a produção de aço a nível nacional. Não existindo a capacidade para a produção desse aço, vai-se construir fornos caseiros nas aldeias e as suas populações são encorajadas em converter todo o metal em aço. Aproveitando todo o material que iam encontrando em objectos vários, incluindo aqueles de uso diário, acabavam por inutilizar esses objectos. Mais, esse aço acabava por ser de muito má qualidade. Mesmo com o extermínio das pestes, logo se constatou que afinal estas não têm apenas um papel negativo, pelo contrário, contribuem para o equilíbrio do eco-sistema.

Havia um entusiasmo produtivo e a ideia era a de que apenas com o entusiasmo, com a vontade, iria conseguir-se aumentar a produção de mais cereais. Utilizaram-se algumas experiências genéticas para criação de novos produtos, mas havia aqui uma fraca base científica. 

Até 1956/57 verificou-se a tentativa de implementação de políticas económicas modestas e realistas. Com o Grande Salto em Frente deu-se uma mudança e este programa de desenvolvimento económico e transformação social revelou-se utópico na substância e caótico na sua implementação. Frank Dikotter é o autor do livro "A Grande Fome de Mao", dedicando-se à análise do período entre 1958-62. Esta é uma obra essencial para se compreender este período da história chinesa, inacreditável nas suas consequências (cerca de 45 milhões de mortes) e delirante nos seus diversos passos (competição por alimentos, técnicas de sobrevivência,  migrações, agressões).

Outra ideia da mesma época, as comunas populares revelavam igualmente idealismo e objectivos muito ambiciosos que partiam do pressuposto de que se vivia numa altura de abundância. A realidade não era, todavia, essa, mas quem a colocasse em causa seria acusado de direitismo e reaccionarismo, pelo que o caminho mais óbvio foi o da distorção e falsificação da informação relativamente ao cumprimento dos objectivos definidos, os quais não poderiam também ser colocados em causa. 

Esta foi a época, ainda, do envio de quadros para os campos, com o fundamento ideológico de  colocar os intelectuais em contacto com as zonas rurais, mas também o de suprir a falta de mão de obra aí e de descongestionar as cidades do seu excesso populacional.

O Grande Salto em Frente e as Comunas Populares foram objecto de crítica dentro do partido. Mao afasta-se um pouco, mas o seu culto não cessa. Volta, dedicando a sua atenção a casos específicos de esforço agrícola, como o caso da aldeia de  Dazhai, o modelo a ser seguido, declara guerra contra a natureza com a sua "grande luta contra os vales e rios tortos" (a natureza é que estava errada e, por isso, uma vez mais como consequência eis a alteração do seu equilíbrio ecológico...), decreta o modelo de camponês, ao lado do modelo de soldado e do homem de ferro modelo de todas as unidades industriais e fabris.


Falta algo? E então a crítica à ideologia burguesa reaccionária? Havia que denunciá-la e eis que chega a Grande Revolução Cultural Proletária em 1966, a qual duraria 10 anos. Promovida por Mao e outros elementos da ala esquerda radical do PCC, da qual Zhou Enlai não fez parte, pretendia acabar com os problemas de correcção ideológica dentro do partido. Em consequência, elementos do povo insurgiram-se contra elementos do partido, levando a purgas, e todos foram incentivados a criticar todos.

O movimento assentava em 16 princípios e apontava a mira a 4 velharias: velhas ideias, velha cultura, velhos costumes e velhos hábitos, na medida em que estas faziam parte do acervo cultural dos burgueses. Seria o próprio PCC a liderar o processo da Revolução Cultural, mas acabou por existir um descontrolo e acabaram por aparecer grupos autónomos, os guardas vermelhos, dispostos a defender as ideias de Mao, muitas vezes até contra o partido. Estes guardas vermelhos eram na sua maioria estudantes, filhos de quadros do PCC que muitas das vezes denunciaram até os seus pais. A situação acabou por se tornar caótica, com rivalidades entre os guardas vermelhos, levando à intervenção do Exército de Libertação Popular. 

Entre 1973 e 1976 surgia a campanha que ficou conhecida como "Segunda Revolução Cultural", com a mira sobre Lin Biao e Confúcio, ou seja, sobre o exército e a tradição. A confusão mental instalou-se na população, com a crítica a elementos que haviam estado no centro do poder, causando um enorme desgaste e uma dúvida sobre quem e o que se deveria defender.

A década 1966-76 acabou por ser uma década perdida. As instituições praticamente não funcionaram, incluindo as escolas, e o investimento foi praticamente nulo.


Em 1976 a situação muda. Primeiro morre Zhou Enlai, figura querida a nível nacional, e, depois, Mao.
Na República Popular da China pós Mao, Hua Guofeng começou por assumir o poder. Era uma figura com pouco carisma interno, desconhecida a nível nacional, mas sobre quem Mao depositava confiança. Temeu-se que o Bando dos Quatro (que incluía Jiang Qing, a mulher de Mao) pudesse tomar o poder, mas tal não aconteceu, tendo, ao invés, os seus membros sido perseguidos e presos.
Deng Xiaoping, que havia sido purgado durante a Revolução Cultural, acabou por merecer o apoio de indivíduos de diversos quadrantes e torna-se primeiro-ministro. Assumindo uma posição muito pragmática, declara que o que é necessário é procurar a verdade a partir dos factos, acabando com a política baseada em objectivos sem ter uma base prática. 

No "julgamento" das políticas de Mao considerou-se que a Revolução Cultural havia sido um desvio ao seu pensamento e que Lin Biao e o Bando dos Quatro haviam sido usurpadores do poder. Que a responsabilidade de Mao tinha de ser vista à luz de um indivíduo que tinha sido um verdadeiro revolucionário, mas que por uma questão de ímpeto tinha vindo a contradizer o seu verdadeiro pensamento. Assim se salvaguardava a continuidade sem se colocar em causa todo o sistema, ainda que se seguisse uma orientação diferente.

Em 1975 Deng Xiaoping dedicou-se a promover As Quatro Modernizações. A ideia não era nova, havia sido já defendida por Zhou Enlai nos anos 60, e consistia na implementação de uma rápida modernização em vários sectores como a agricultura, a indústria, a defesa nacional e a ciência e tecnologia. Havia a noção de que a China se tinha atrasado em relação aos outros países, dai a relevância dada à nova tecnologia e aos novos conhecimentos científicos, bem como à política de porta aberta. A "política de abertura" é, aliás, o chavão que descreve o período de Deng Xiaoping. Bem como a designação "socialismo de características chinesas", um estado socialista com uma economia capitalista.

Consegui chegar ao fim sem utilizar a palavra delírio? Vida longa ao camarada Mao.

sábado, 8 de julho de 2017

A reunificação chinesa, a época dourada e a dinastia estrangeira - os Sui, Tang, Song e Yuan

No ano de 220 a dinastia Han caiu para uma rebelião de camponeses, evento recorrente na história chinesa. Entrou-se, novamente, numa época de divisão na China. Como governo foram-se sucedendo o Período dos três Reinos, os Jin Ocidentais e Orientais e as dinastias Zhou do Norte e do Sul.

Assistiu-se à emergência de grandes militares e estrategistas como Cao Cao e Zhuge Liang. O aclamado filme "A Batalha de Red Cliff" retrata com maestria este período.


A reunificação da China veio em 581 com a instituição da dinastia Sui (581 - 618), com a união do norte e do sul. Desta época Sui data um projecto enorme da história mundial: a construção do Grande CanalA China possui grandes rios (embora não tão marcantes como na Índia, por exemplo), como o rio Amarelo e o rio Yangtze que correm de oeste para este, desaguando no mar. Entre 605 e 610 milhões de trabalhadores chineses dedicaram-se à empreitada de, aproveitando antigos canais que careciam de restauro e também alguns rios e lagos naturais, construírem um braço navegável que corresse de norte para sul e estivesse conectado aos grandes rios. Esta criação milenar do Homem possuía originalmente 2000 km de comprimento e uma altura suficiente para o transporte de mercadorias que desenvolveria exponencialmente a economia e cultura chinesas da época.

Em 618 nova rebelião de camponeses viria a resultar na instituição da dinastia Tang (618 - 907). Os Tang, a mais cosmopolita de todas as dinastias chinesas, estenderam o território chinês como nenhuma dinastia o havia feito até aí. Criaram uma sociedade estável e em paz, o comércio e o transporte alcançaram um alto nível de desenvolvimento, as cidades eram vibrantes. Chang'an era a sua capital e, nesta época, uma das maiores do mundo. Uma metrópole, mesmo, planeada de forma simétrica e modelo para muitas outras cidades que a imitariam (a Pequim dos Ming teve-a como modelo), onde acorriam letrados, mercadores e artesãos para estudar, comerciar e trabalhar. Aqui encontrávamos inúmeras lojas, diz-se que mais de 200 tipos de lojas, com todo o género de produtos à venda, incluindo os mais preciosos e raros. A prosperidade era imensa. 


O centro cultural da China estava, então, em Chang'an, com os maiores calígrafos, pintores e poetas. Li Bai e Du Fu, os maiores poetas da China, viveram nesta época e contribuíram para que a poesia chinesa alcançasse padrões enormes, influenciando os vizinhos Japão e Coreia. Na corte Tang quase qualquer um escrevia poesia relatando as suas actividades diárias e expressando os seus sentimentos. Nesta época esperava-se que todos os chineses educados pudessem ler, escrever e admirar poesia. 


Também a escultura, nomeadamente em grutas, atingiu o seu pináculo nesta época, de que são testemunho as estátuas de Buda e murais sagrados sobretudo nas três grutas de Yungang, em Datong, de Longmen, em Luoyang, e Mogao em Dunhuang.

As diversas rotas da seda cresceram como nunca e a interconexão e convívio de várias religiões era uma marca evidente, embora a corte Sui e Tang tenham adoptado o budismo. Considerada a época dourada do budismo na China, o budismo era central em diversos aspectos da vida chinesa. Assistiu-se ao desenvolvimento de várias escolas do budismo, com o budismo Chan como o mais popular (no Japão e no ocidente é conhecido como budismo zen). Este desenvolvimento do budismo trouxe consequências económicas e artísticas muito positivas. O mercado de peregrinações era vibrante e o comércio de objectos de arte religiosos intenso. Em Dunhuang, onde a Rota da Seda começava, havia centenas de mosteiros budistas. Xuanzang empreendeu uma peregrinação à Índia em busca de escrituras budistas para as trazer para a China. O monge iniciou a sua viagem em 627, atravessando desertos e montanhas, tendo permanecido na Índia cerca de 15 anos a estudar os documentos budistas. Escreveu a sua aventura numa obra traduzida em diversas línguas, o Records on the Western Regions of the Great Tang Empire. A sua peregrinação inspirou o romance clássico chinês "Viagem ao Ocidente" e esta e outras peregrinações tiveram ainda como efeito o estreitar das relações entre China e Índia. 

Outra marca distinta da dinastia Tang foi a de conferir algum estatuto às mulheres da alta sociedade. Como prova maior, eis o facto de Wu Zetian ter sido a primeira e única monarca na história da China, feito alcançado em 690.


Os Tang introduziram ainda um código penal avançado que perduraria séculos e, mais importante,  desenvolveram o sistema de exames civis imperiais iniciado pelos Sui. Esta era a forma de seccionar homens talentosos para as posições oficiais no governo imperial. Incontáveis candidatos testavam os seus talentos todos os anos, com ênfase no conhecimento dos clássicos confucionistas, mas apenas uns poucos passavam. Esta era uma forma de alcançar uma posição na orgânica do estado e, sobretudo, de ascensão social. O sistema de exames civis é mais uma marca distinta da civilização chinesa, o qual perdurou até aos últimos anos da última dinastia Qing, bem mais de mil anos de actividade, portanto, quando foi abolido com críticas por ser então um método demasiado rígido que não permitia que a China adotasse métodos científicos modernos. 

A queda dos Tang acabou por acontecer pela ausência de autoridade central. O poder político e militar não era o forte dos Tang, mas a sociedade e cultura que criaram continuava a florescer.

Após um período de cerca de 50 anos em que se assistiu ao governo por parte de diversas curtas dinastias e reinos (5 dinastias e 10 reinos), os Song impuseram-se, ainda que sob constante ameaça de grupos étnicos minoritários como os Liao e os Jin. Tal como os Tang, não eram tão fortes militarmente e por isso mais tarde continuaram a sofrer ataques das tribos nómadas, os "bárbaros do norte", como os Khitan e os Jurchen, até serem arredados do poder pelos mongóis.

A dinastia Song (960 - 1279), com capital em Kaifeng e Hangzhou, abraçou o ideal confucionista de um estado burocrático centralizado dirigido pelo imperador sob os conselhos dos burocratas civis versados nos clássicos confucionistas. 


Com os Song a produtividade agrícola aumentou exponencialmente graças ao ganho de mais terra cultivada à medida que as pessoas desciam para sul e iam ocupando novas terras e às novas técnicas testadas, como a da dupla cultura do arroz, permitindo duas colheitas por ano, e às novas culturas, como a do chá, cana de açúcar, bambu e algodão. Com isso a corte Song viu os seus cofres crescerem com a cobrança de mais taxas. A indústria do ferro também alcançou um grande desenvolvimento. Produtos como a seda, lacados e porcelana atingiram elevados padrões de qualidade.

O comércio prosperava, assim como a ciência e tecnologia. Quatro grandes invenções tiveram lugar durante a época da dinastia Song: a técnica de fazer papel, a impressão, o compasso e a pólvora. Por esta altura começou a circular o primeiro dinheiro em papel, a indústria de impressão de livros teve um boom incrível com tudo o que de enorme representa a circulação do conhecimento impresso, o compasso e correspondente assistência à navegação levou à prosperidade do comércio marítimo e a pólvora à proliferarão de armas de fogo e da indústria. 


Em termos culturais, a pintura nos Song atingiu níveis artísticos elevados. 
Como curiosidade, a moda dos pés enfaixados terá começado a tornar-se popular nos tempos dos Song, sendo sinal de estatuto social e ligada à ideia de que pés pequenos seriam mais atraentes.

Mas os Song continuavam a ser ameaçados a norte. Tribos mongóis que haviam sido unidas por Temujin, mais conhecido por Genghis Khan, e que sob o seu comando estenderam o seu domínio até ao Danúbio na Europa, haveriam de conquistar a China e fundar a sua dinastia. 

Os Yuan (1279 - 1368) constituíram uma dinastia fundada por Kublai Khan, neto de Genghis Khan, e viriam a unificar a China como uma só nação novamente. A dinastia mongol estabeleceu a sua capital em Pequim, então conhecida como Dadu ou Hanbali, a cidade do Khan. Os mongóis lançaram mão da empreitada de construção de Dadu, incluindo a cidade exterior, a cidade imperial e a cidade palaciana, e fizeram dela uma metrópole.

Kublai Khan reformou o sistema administrativo, tornando mais efectiva a administração central, e com ele começou, por exemplo, a administração central do governo de Taiwan. A China era então um país multi étnico. Os Yuan estabeleciam contactos com diversos países da Ásia, da Europa e da África. Em 1271 chegou à China o mais famoso estrangeiro, Marco Polo de seu nome. Tornou-se um favorito de Kublai e por 24 anos ali ficou. Descreveu um oriente fabuloso, dando a conhecer costumes, eventos históricos, crenças, cidades, produtos e comércios em detalhe, fazendo despertar o interesse dos ocidentais pela civilização chinesa, tendo influenciado uma série de navegadores e aventureiros que lhe seguiriam as pisadas por terras do oriente.


A dinastia Yuan, governo estrangeiro que, no entanto, defendia ideias do neoconfucionismo, apesar de discriminar os letrados, fez com que a população chinesa sofresse às suas mãos mongóis e a economia acabou por ter um retrocesso, nomeadamente com a destruição da indústria do ferro. 

Os Yuan lançaram várias expedições navais de conquista do Japão, sem sucesso, todavia.
O maior contributo da dinastia mongol terá sido o de estender o território como nunca até aí, muito por força das políticas de alianças com uigures, tibetanos e outros povos que estavam para além daquilo que se conhecia como "China propriamente dita", incorporando estas pessoas e seus territórios no seu estado.

Em 1368 uma nova dinastia etnicamente chinesa acabou por emergir na China, os Ming.

Dos primórdios da China até à Unificação Feudal sob os Qin e os Han

Não é certa a datação dos primeiros humanos no território que hoje conhecemos como China.
Certo é que essa é uma longa história e, acreditam alguns, pode ser traçada ao Paleolítico. Estes crêem que as raízes da China primitiva estejam na província de Yunnan, cerca de 1 700 000 anos atrás, onde o mais antigo ser humano foi encontrado, o Homem Yuanmou. Mais antigo até do que o Homem Peking, figura do Neolítico que até há pouco era a mais remota reconhecida pelos historiadores. Nesta época, 10000 ou 8000 anos a.C., os homens dedicavam-se à agricultura e já existia a domesticação de animais, sobretudo na zona do vale dos rios Amarelo e Yangtze. 
Mas este é um passado muito, muito distante.

Ao contrário dos japoneses, os chineses são mais pragmáticos e não costumam atribuir a criação do seu país a mitos. No entanto, e ainda que não parte da história oficiosa, alguns mitos existem, como o da lenda de Pangu. Segundo este, a criação do homem na China antiga pode ser atribuída ao gigante Pangu que, descendendo da Terra e do Céu, após a sua morte viu os seus olhos transformarem-se no sol e na lua, os seus quatro membros em montanhas, sangue, rios e lagos e mares, os seus tendões em campos, as suas artérias em estradas e caminhos, os seus cabelos em estrelas, a sua pele em flores, relva e florestas, os seus dentes em ossos e o seu suor em orvalho.

A primeira dinastia chinesa é a Xia, instituída cerca de 2070 a.C. Esta época marca uma passagem da Idade da Pedra para a Idade do Bronze e daqui datam já vestígios de vasos de cozinhar em bronze.

Da dinastia Shang, instituída cerca de 1600 a.C., tribo antiga nómada com raízes no baixo Rio Amarelo, existe mais informação e vestígios, nomeadamente artefactos com inscrições em ossos, carapaças de tartaruga e louça em bronze. 

Aos Shang sucedeu um reino vassalo, os Zhou, que foi crescendo em poder e aliado a outras tribos e pequenos estados acabou por fundar a sua dinastia em 1046 a.C. Os Zhou valorizavam já a agricultura e reconheciam mérito àqueles que possuíam talento. 


Xia, Shang, Zhou, três dinastias com nomes que talvez pouco dirão ao comum dos mortais. 
Mas se acrescentarmos o nome de Confúcio, talvez este passado distante possa ser mais próximo e reconhecível. Os Zhou podem ser divididos em Zhou Ocidentais (com capital em Hao, hoje Xi'an) e Zhou Orientais (com capital em Luoyang), este último com dois períodos: o período da Primavera e Outono, de 770 a 476 a.C., e o período dos Estados Guerreiros, de 475 a 221 a.C.
É no período da Primavera e Outono que encontramos Confúcio (551-479 a.C.). Nome fundamental da cultura chinesa, os seus ensinamentos e ideologia deixaram marca até aos dias de hoje. Defendia a ideia da benevolência por parte dos governantes para com o seu povo e a ideia de que o poder político deveria ser baseado na virtude e não na força, ligado ao conceito de "mandato do céu" (o imperador governaria enquanto seguisse aqueles preceitos). As pessoas deveriam ser governadas pela moralidade e não pela tirania. Educador, defendia que todos, independentemente do seu estatuto social, deveriam obter educação e não apenas a aristocracia. Estabeleceu escolas privadas, acabando com o monopólio do estado no domínio da educação. 

Este período da história chinesa foi vibrante em termos culturais e filosóficos. A par de Confúcio encontramos outros grandes pensadores como Laozi (escreveu o Tao Te Ching), Zhuangzi, Mêncio, Xunzi, Mozi e Hanfeizi. Inúmeras escolas de filosofia foram criadas, representando os taoistas, confucionistas, moistas e legalistas, tendo ficado conhecidas como as "100 Escolas do Pensamento". 
A cultura chinesa florescia, a par do que sucedia no antigo Egipto e nas civilizações indianas. Na Grécia apareciam as cidade-estado. Relativamente ao período da Primavera e Outono, a diferença era que nos estados da China a política não estava tão desenvolvida como na Grécia Antiga e o poder monárquico ainda imperava, ao contrário da ideia grega de governo pelo povo.

Este era um tempo de guerras entre estados, com inúmeros pequenos estados vassalos a rivalizarem entre si, anexando-se uns aos outros em busca da hegemonia. A "Arte da Guerra", o mais antigo tratado de ciência militar do mundo, data desta época. Escrito por Sun Tzu, estrategista durante o período da Primavera e Outono, estas constantes guerras entre estados levaram-no a pensar sobre a estratégia militar. Assente nas ideias de disciplina e treino das tropas, dá-nos a sua visão da guerra, revelando a importância de conhecermo-nos a nós próprios e ao nosso inimigo, usando a guerra apenas como último recurso, uma vez que era um enorme fardo para as pessoas. Os seus "mandamentos" são utilizados ainda hoje em diferentes domínios que não o do contexto da guerra.
Até que as guerras e mais guerras acabaram por resultar em sete estados maiores donde nesta sociedade feudal dividida veio a impor-se o reino Qin com o seu imperador Qinshihuang. Em 221 a.C. este unifica a China Antiga sob um único governo e funda a dinastia Qin.

Os Qin foram a primeira dinastia feudal a governar a China. Partiram da ideia da China como um país multi-étnico com uma monarquia centralizada e autocrática. Esta época Qin, a par da época da dinastia Han (202 a.C. a 220) que lhe sucedeu, viu serem criadas diversas instituições que perduraram por tempos. Os Qin tomaram reformas no sentido de consolidar o seu poder. Criaram o cargo de primeiro-ministro que presidia ao governo, outro cargo para a burocracia e outro cargo para o comando do exército. Todos estes elementos eram escolhidos e removidos pelo imperador. O país foi dividido em prefeituras, igualmente com elementos escolhidos por si. Com isso o imperador conseguia controlar todo o estado. Fixou ainda medidas de uniformização do peso, volume e comprimento, no sentido de desenvolver a economia, e emitiu uma moeda igualmente uniforme, procurando ainda unificar os caracteres. Com excepção dos livros de medicina e agricultura, mandou queimar todos os livros para reforçar a ideologia do regime no controlo do povo, perseguindo os oponentes (incluindo os seguidores de Confúcio).

Foi com os Qin que se iniciou a construção da Grande Muralha da China, tentativa de minimizar as invasões dos nómadas do Norte, ligando os muros defensivos que haviam sido construídos pelos vários estados. O território chinês tinha então 20 milhões de habitantes e ia da Grande Muralha a norte ao Mar do Sul da China a sul, e do Pacífico a oriente às montanhas de Longxi a ocidente. 


Um outro símbolo da China data desta época: o Exército de Terracota, mausoléu do imperador Qinshishuang, perto de Xi'an, com as suas famosas figuras de guerreiros e cavalos, as quais foram descobertas apenas em 1974.

A dinastia Han (206 a.C. - 220) pode ser dividida em dois períodos: os Han Ocidental, instituídos em 202 a.C., com Chang'an (Xi'an) como capital, e (depois de uma brevíssima queda para a instituição da dinastia Xin no ano 9, a qual durou apenas 16 anos) os Han Oriental, restauração dos Han com mudança da capital para Luoyang.

Os 400 anos de governo desta dinastia Han deixaram marcas e tiveram uma profunda influência nos governos que se seguiram. Desde logo o nome da nacionalidade chinesa, Han, a maioria étnica entre os chineses. Mas também nos caracteres, na linguagem, na cultura. Sima Qian é um nome maior da cultura chinesa com os seus registos históricos, datados de 145 a.C., o primeiro livro histórico biográfico de fundo na China, abordando vários assuntos como a política, economia, cultura e militar. A produção cresceu, a economia prosperou, a tecnologia e a cultura floresceram, viram-se avanços enormes na medicina e na astronomia. E a invenção do papel teve como consequência um salto enorme para todo o mundo. Nesta época a Rota da Seda ligava a China com o ocidente e a cultura chinesa deu-se a conhecer ao mundo e começou a encantar. A China estava então aberta ao contacto o outro. 

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Da Guerra Sino-Japonesa até à República Popular da China (1937-1949)


A Segunda Guerra Sino-Japonesa (1937-1945) deve ser vista no quadro de relações tensas que se estabeleceram entre a China e o Japão após 1931.
O Japão invade a China em 1937 invocando o direito de legítima defesa preventiva tendo em conta o sentimento anti-japonês promovido pelas autoridades chinesas que haviam adoptado como política nacional a antagonização do Japão. Pretendiam estes a criação de uma Nova Ordem na Ásia Oriental. O Japão desejava uma política de cooperação, um estado independente dominado pelos interesses japoneses, mas com autoridades locais. A China não responde e o Japão continua a avançar até Nanquim, passando a ter como objectivo o derrube do governo nacionalista na China.
Nanquim, na altura capital, é ocupada em Dezembro de 1937 e aí iria ser perpetrado o bárbaro acontecimento conhecido como Massacre de Nanquim (ou violação). Estima-se que tenham morrido cerca de 200 000 pessoas num período de tempo muito curto. A ocupação durou seis semanas, mas os mortos aconteceram esmagadoramente na primeira semana.

Em 1938 a China estava dividida e os japoneses controlavam sobretudo as zonas urbanas, enquanto que muitas zonas rurais eram já controladas pelos comunistas. Face a esta China ocupada, não restava à população outras alternativas que não a fuga (para a concessão francesa em Xangai ou para Hong Kong ou Macau), a resistência (guerrilha comunista no interior) ou a passividade ou colaboração.
Chiang Kai-shek optava pela posição de não resistir nem negociar. Entendia que primeiro havia que eliminar os problemas internos - os comunistas. No entanto, Chiang Kai-shek tinha também a oposição interna de Wang Jingwei, da ala esquerda do seu próprio partido.
Havia falta de produtos, sobretudo manufaturados, a produção local era reduzida e o bloqueio económico japonês prejudicava e muito o país. O Estado possuía muitas despesas e os rendimentos eram curtos. A opção pela emissão de papel moeda trouxe como consequência o grave revés da inflação, para além da especulação e corrupção que se seguiram. O sentimento entre a população era de injustiça e desigualdade. 


A Longa Marcha dos comunistas havia chegado a Yan'an em 1935 e na próxima década os seguidores de Mao desenvolveriam aqui as suas experiências e exerceriam algum controlo a norte da China.
Os comunistas já tinham tido a oportunidade de implementar as suas políticas com a criação do Soviete de Jiangxi - Fujian, umas mais radicais, outras mais moderadas. Em Yan'an seguem um programa político moderado. Fala-se em harmonia de classes, e não em luta, não há redistribuição de terras, antes se fala de que os indivíduos proprietários de terras devem voluntariamente baixar as rendas e aqueles que emprestam dinheiro voluntariamente reduzir os juros. Ou seja, uma prática de colaboração, mas com uma forte pressão. Seguiu-se ainda um programa de mobilização da população.
Em 1940, um texto redigido por Mao, "Nova Democracia", aponta duas etapas na revolução chinesa: o estabelecimento da democracia e do socialismo. Mas adverte que no caso chinês tem de se falar num novo tipo de democracia, de uma nova democracia, seguindo a ideia de que nos países subdesenvolvidos havia primeiro que criar as condições de se estabelecer uma democracia e só depois o socialismo. Considerava que a China vivia numa situação semi feudal, semi colonial (guerras do ópio) e também colonial (Manchúria). Logo, a primeira etapa da revolução chinesa seria mudar a forma colonial e semi feudal da sociedade para uma sociedade independente e democrática. A Revolução de 1911 havia sido o começo, mas o processo estava ainda inacabado, e a Revolução de 1911 corresponderia à velha democracia, uma vez que o seu carácter social era o de uma revolução democrato-burguesa e não proletário-socialista. Ou seja, a Revolução de 1911 não era suficiente. Em 1940 vivia-se uma realidade diferente e havia então um paradigma que era o da construção do socialismo e a criação de uma nova democracia. Na verdade, o que parece estar por trás destas ideias de Mao era a sua necessidade de conciliar as ideias do socialismo com as dos nacionalistas do KMT, conciliar o socialismo com as ideias burguesas. Não poderia ser apenas a burguesia a participar no processo e ao início Mao falava também na participação do proletariado ou direcção do proletariado. Mais tarde, um certo revisionismo faz aparecer apenas a parte da "direcção do proletariado", embora o objectivo fosse a ditadura conjunta de todas as classes revolucionárias, burgueses incluídos. 
Quanto à economia nesta Nova Democracia, Mao não propõe a nacionalização de todo o capital privado. O estado viria a tomar o papel da direcção, mas não de tudo, uma vez que a economia chinesa ainda estava num estado atrasado, pelo que havia a noção da necessidade de um certo desenvolvimento. Quanto às terras, haveria o confisco das terras dos terratenentes (aqueles que não trabalham as terras, apenas as arrendam a outros). Em Yan'an havia sido abandonada a ideia de redistribuição de terras em favor de uma diminuição das rendas - agora é diferente, mas continua a ser uma política moderada relativamente ao antecedente a Yan'an. Agora há uma ideia de igualização da propriedade da terra que não é especificamente comunista, uma vez que Sun Yat Sen ("a terra a quem a cultiva") também já havia falado neste sentido e, assim, está ideia poderia ser abraçada também pelos nacionalistas.


Quanto à cultura da Nova Democracia, Mao entendia que havia uma cultura imperialista seguida por alguns chineses que seguiam uma ideologia de escravo. Era necessário afastar essa cultura imperialista e semi-feudal e adoptar-se um novo rumo em que os seus elementos sejam colocados de parte. Uma nova cultura que propunha o arrasar das ideias tradicionais, uma cultura socialista, mescla de algumas características tradicionais chinesas com alguns elementos progressistas estrangeiros.
Após a Nova Democracia, em 1942 seguiu-se a Campanha de Rectificação, zhengfeng, da posição que os indivíduos tinham dentro do partido. Anteriormente havia influência do KMT e agora deveria haver uma revolução ideológica e eliminadas as facções, sendo necessário que todos pensassem da mesma maneira.
Mao encontrava três defeitos no PCC: subjectivismo (defeito na forma de estudo, englobando no subjectivismo o dogmatismo e o empirismo, sendo o dogmatismo o pior defeito, na medida em que não se podia estudar apenas pelos livros, mas sim aproximar os intelectuais do trabalho prático), sectarismo (defeito na forma das relações internas e externas do partido) e formalismo (defeito na forma de escrita). Os defeitos apontados levavam à conclusão da necessidade de uma maior aproximação ao povo e construção de um consenso. Foram, então, organizadas sessões de grupo do partido onde foi fomentada a crítica dos desvios, de forma aos membros do partido poderem aproximar-se da realidade e corrigir os seus erros.
Como resultado esta medida trouxe o domínio de Mao, com controlo total do PCC e independência do controlo soviético.
No entanto, alguns intelectuais insurgem-se contra este estado de coisas manifestando a necessidade de manterem um papel independente e que com a crítica estariam a contribuir para a campanha de rectificação, pois ao conseguirem identificar os problemas estariam a permitir a sua resolução (alguns exemplos de críticos: Wang Shiwei e Ding Ling). Debalde. As razões para a não aceitação da crítica pública pelo PCC prendia-se com a ideia de que tal poderia ser utilizado pelos propagandistas japoneses e nacionalistas e, por outro lado, não encaravam que se devesse dar prerrogativas especiais aos intelectuais - todos deveriam utilizar a crítica privada.
Em Yan'an, depois da Campanha de Rectificação, foram realizadas diversas políticas inovadoras num quadro integrado, com a participação popular, descentralização e poder da comunidade - um centro democrático a partilhar as decisões com a periferia.
Alguns movimentos de mobilização da população foram então lançados: movimento para a redução de tropas e uma administração simples, movimento de deslocação para as aldeias, movimento para a redução de rendas e juros, movimento cooperativo, movimento produtivo e movimento de educação popular.
O objectivo era manter o povo unido, através da sua participação nos mais diferentes domínios públicos (guerra, revolução, economia, política). O projecto de liderança era uma democracia quase directa em que o povo é a base de tudo: das massas para as massas, um processo de decisão que ficou conhecido como "linha de massas". Tudo isto resultaria numa unidade, com a integração de todos os indivíduos até se identificarem uns com os outros, é uma cooperação das classes, sem antagonização das elites sociais.

Após uma colaboração entre os nacionalistas e os comunistas - a Segunda Frente Unida - para fazer face à guerra e ocupação japonesa ("juntos confrontamos a crise nacional"), um incidente em 1941 levou ao afastamento das duas partes. Por outro lado, no final da guerra os comunistas tomaram a iniciativa de ofensiva geral contra os japoneses e Chiang Kai-shek mostrou-se contra esta acção independente comunista.
Com o fim da guerra em 1945, com a rendição do Japão, o KMT ficaria com o direito exclusivo e o PCC com direito em áreas de acção. Mao deixa de insistir numa coligação KMT / PCC e passa a reclamar uma Assembleia Nacional como forma de limitar o poder de Chiang Kai-shek. Em 1945 chegam a acordo com a definição de alguns princípios gerais, como a democratização, o fim do período de tutela, eleições a nível local e, mais tarde, um governo constitucional. Mantinham-se, todavia, certas divergências, como a defesa pelo PCC de um sistema parlamentar e mais poder para as províncias, bem como a integração das tropas comunistas.
Com o fim da guerra os nacionalistas tinham uma série de vantagens relativamente aos comunistas. Desde logo, Chiang Kai-shek era o líder do governo e sobre ele caíram os louros da rendição japonesa. Os nacionalistas tinham ainda mais recursos, controlavam as cidades e os meios de produção industrial. Possuíam mais meios militares e a colaboração dos japoneses e ajuda dos americanos.


O afastamento entre os dois partidos vai aumentando e a guerra civil era inevitável. 
Os comunistas lançam ofensiva, as suas tropas começam a aumentar e a ganhar moral, ao mesmo tempo que as tropas nacionalistas tinham receio em sair das cidades, suas zonas de segurança, e o seu desgaste levou a um estado de desmoralização. A estratégia militar nacionalista teve erros decisivos e o estado do país saído da guerra sino-japonesa era débil. Muita inflação, corrupção generalizada, fragmentação do estado, com perda de apoio da população, dado também o seu estilo tirânico.
Os comunistas acabaram por ganhar a guerra em 1949, instituindo a República Popular da China.

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Animação Japonesa

Eis dois belíssimos filmes japoneses de animação, ambos de 2013, recém estreados nos nossos cinemas.
Dois mestres:

de Isao Takahata, O Conto da Princesa Kaguya

de Hayao Miyazaki, As Asas do Vento

sexta-feira, 27 de março de 2015

One's Company e Journey to a War

Dois livros sobre este período da história chinesa da década de 30.


Peter Fleming escreveu One's Company: A Journey to China, um livro de viagens sobre os sete meses de 1933 que passou na China. Embora faça questão de esclarecer que a China é demasiado grande, populosa e variada para que esses meses façam dele um entendido na matéria, este não deixa de ser um relato muitíssimo valioso desta época, cheio de apontamentos irónicos.
A obra está dividida em dois capítulos, um primeiro dedicado ao Machukuo, o estado fantoche criado na Manchuria pelos japoneses, e um segundo dedicado à China Vermelha, numa altura em que a mobilização comunista estava em marcha e os nacionalistas se iam defendendo.


Journey to a War é também um livro de viagens publicado nos anos 1930'. W.H. Auden e Christopher Isherwood oferecem-nos uma obra em verso e prosa. Encontramos aqui poemas de Auden sobre a jornada desta dupla na China em 1938, um diário de viagens de Isherwood sobre essa mesma jornada e as observações de ambos acerca da Guerra Sino-Japonesa. Ainda, uma série de fotografias de Auden.

quinta-feira, 12 de março de 2015

Manchukuo


O estado de Manchukuo, criado em consequência da ocupação japonesa na Manchúria, seguia uma ideologia confucionista. O "caminho real", ideia de Mêncio - governo pelos que detinham a força e governo pelos que eram legitimados pelo céu - era o postulado dominante. Antes esta região era controlada por senhores da guerra que detinham a força; agora era controlada por um governo legítimo. Seguiam uma ideia de progresso, mas utilizando uma ideologia conservadora chinesa.
Este estado pretendia demonstrar que era o resultado da vontade popular - o que era difícil, pois não só não havia uma história de reclamação da sua independência, como a maioria da população era han (a etnia maioritária na China). Este era um estado fantoche, na medida em que as decisões eram tomadas em função dos interesses japoneses. A governação era seguida em grande parte pelos japoneses, havia peritos do Japão na administração pública e a Companhia de Caminhos de Ferro do Sul vêm a exercer as suas funções em todo o território, bem como o Exército de Guandong.
O Manchukuo estava subordinado ao estado japonês - de acordo com o "novo imperialismo" era um estado independente, mas governado na prática por um estado novo imperial - o Japão.
O Japão utilizou no Manchukuo um modelo que pretendia vir a desenvolver em toda a Ásia. Daí a propaganda acerca do Manchukuo: "o pomar do mundo", "todos vivem em paz", "o paraíso de um novo país, de um novo povo", "paraíso dos antepassados" - ideia de nação.

Depois da instituição da República na China, em 1912, optou-se por preservar o imperador, como forma de pacificação. O imperador não tinha poderes políticos, mas era pago pelo Estado chinês para que mantivesse o seu estilo de vida, incluindo a residência na Cidade Proibida e Palácio de Verão. Esta situação permaneceu até 1924, data em que o imperador foi expulso. Puyi passa a viver na concessão estrangeira japonesa de Tianjin como forma destes estreitarem os seus laços com os manchus. Os japoneses concordavam com um estado manchu, mas não que fosse restabelecida a dinastia Qing. Um compromisso foi alcançado e em 1934 foi dado a Puyi o título de imperador do Manchukuo.

Ao contrário do que refere muita da historiografia chinesa, segundo a qual houve uma resistência generalizada à ocupação japonesa, tal não terá sido assim. Pelo contrário, é certo o colaboracionismo generalizado das elites locais. Esta situação deveu-se à política de não resistência do KMT, com encorajamento do colaboracionismo, e à oposição a Zhang Xueliang, o senhor da guerra local, em virtude da sua aplicação de recursos económicos em meios militares para conquista da supremacia nacional. Por outro lado, havia um saudosismo relativamente ao estado imperial chinês e sentia-se que se tinha entrado no caos com a república. Ou seja, a ideia era a de que o modelo imperial era aquele que deveria ser seguido e que a ligação aos japoneses era necessária para a longo prazo se criar uma sociedade estável. Não obstante, os meios usados pelos japoneses também forçaram esse colaboracionismo, quer com a actuação pela força, quer através da persuasão de projectos sedutores de bem estar social e redução fiscal.