domingo, 23 de outubro de 2011

Cinemas da Índia

Agora virei-me para o cinema indiano, apanhando a boleia do curso que tenho estado a frequentar este mês no Museu do Oriente: Índia: Cinema e Sociedade.
Bollywood à parte, a grande estrela do cinema da Índia é o realizador Satyajit Ray, que adaptou umas quantas obras de Tagore. No entanto, é mais admirado no ocidente do que popular no seu país. Como disse um colega do curso que é crítico de cinema, Ray não representa o cinema indiano, mas antes o cinema que nós europeus gostamos de ver. Ainda assim, vi partes do seu Charulata, de 1964, e fiquei com vontade de ver a totalidade deste filme.

Mais recente, a indiana / canadiana Deepa Mehta tem uma trilogia imperdível sobre histórias que retratam a sociedade indiana passada e contemporânea.



O primeiro, Fire, de 1996, é aquele que esteticamente é menos interessante, mas talvez o mais ousado: a história de amor entre duas cunhadas.



Earth, de 1998, é baseado no livro de Bapsi Sidhwa “Cracking India” (sem tradução portuguesa), e aqui é-nos contada a história de um grupo de indianos de Lahore, que inclui muçulmanos, hindus, sikhs e parses, que de repente, com a partilha da Índia pelos britânicos em 1947 e a decisão de incluir Lahore no Paquistão, deixam de viver em paz. Pior, vivem a tragédia consequência da cegueira, estupidez e fanatismo dos humanos.



A fechar a esta trilogia vem Water, de 2005. Agora foi ao contrário, a colaboração entre Deepa Mehta e Bapsi Sidhwa fez com que esta última baseasse o seu livro Água (este com tradução portuguesa) no filme. É a história arrepiante e inacreditável da situação social das viúvas na Índia, as quais segundo os preceitos hindus com a morte do marido deixam de ter qualquer proveito no mundo – o que se manteve até aos tempos de Gandhi.



Vi ainda Mr and Mrs Iyer, de 2001, de Aparna Sen, também actriz. Mais uma vez a sociedade indiana é nos retratada de forma a que nos reviremos no sofá. Os conflitos entre hindus e muçulmanos são nos mostrados ao mesmo tempo que vemos uma viagem de autocarro e o desabrochar de um amor entre uma hindu casada e um muçulmano fotografo. Tudo sem cair no cliché ou na lamechice. Fiquei com vontade de ver mais filmes desta realizadora.



E, finalmente, vi pela primeira vez um filme de Bollywood. Dilwale Dulhania Le Jayenge, de 1995, com o mega astro Shahruk Khan, ainda está em cartaz na Índia e é um dos maiores sucessos da sua indústria. Boa disposição, música melódica que entra no ouvido e acordes daquele instrumento que o palhacito do Shahruk Khan tocava que não me saem da cabeça. Veredicto: confirmo que é excelente entretenimento e não só para os indianos da Índia e sua diáspora.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Rithy Panh

Rithy Panh é um realizador cambojano de que em post anterior já tinha referido desejar ver uns filmes seus antes do Natal.
Este autor nasceu em Phnom Penh e viveu os horrores da guerra do Khmer Rouge. Fugido para a Tailândia, conseguiu chegar a França e hoje, já no seu país, é responsável pela criação de filmes e documentários, muitos deles inspirados na experiência vivida pela esmagadora maioria dos seus concidadãos.
Dele vi os seguintes filmes:



- “Uma barragem contra o Pacífico”, de 2008, inspirado na obra de mesmo nome de Marguerite Duras. É a história de uma mãe francesa com os seus dois filhos mais do que ambiciosos e sem escrúpulos que lutam contra as adversidades da água que teima em invadir as suas plantações. A fotografia é lindíssima.



- “Neak Sre”, de 1994, ou “a gente do arrozal”, conta a história de uma aldeia de cambojanos que vive da plantação de arroz. É um filme cru que retrata bem a dureza do trabalho com o arroz.



- “S-21, la machine de mort Khmere Rouge”, de 2003, não é cru. É um documentário da pura realidade. Realidade passada e que nunca se crê que seja possível existir, quando mais repetir-se. Filmada na antiga escola, depois tornada a tristemente mítica prisão S-21, hoje museu, onde se cometeram das maiores atrocidades em trânsito para atrocidades ainda maiores. Em 2008 estive aqui e daí resultou este post http://andessemparar.blogspot.com/2008/11/phnom-penh.html



- Un soir aprés la guerre, de 1998, trata da vida de um rapaz e de uma rapariga no pós-guerra. Eles querem formar um par, amam-se, mas a necessidade da sobrevivência do dia-a-dia numa cidade onde poucas esperanças existem atormenta o seu relacionamento. Foi o filme de Rithy Panh que mais gostei e, em resumo, é imperdível.

Dia do Japão em Portugal

A propósito da re-abertura do jardim do Japão, em Bélem, comemorou-se o dia do Japão no passado dia 1 de Outubro.
Perdi-o. Mas a mana esteve presente e fez a reportagem no seu novo blogue de degustação.
Ei-la:
http://cantinadossabores.blogspot.com/2011/10/festa-do-japao.html

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Khushwant Singh - Deli



Mas, nos últimos tempos, o livro que mais gostei de ler, que amei mesmo, foi o Deli, de Khushwant Singh.
Um género de história da cidade, desde o tempo dos imperadores mogoles (não sei como se escreve o plural disto em português) até à contemporaneidade. Misturado com a história de um sikh que, sem que se perceba muito bem como – os relacionamentos na vida são mesmo assim – recebe em sua casa uma hermafrodita, ainda por cima um bocado para o feiota. E gosta.
Um capítulo inteirinho sobre o povo mais cagão do mundo – pudera! com tanta especiaria na comida…
Um hino de amor à cidade de Deli, com muito erotismo e humor à mistura.
É, assim, um livro sério e descontraído ao mesmo tempo.
Eis outra leitura obrigatória, goste-se da Índia ou apenas de excelente literatura.

Passagem para a Índia – E.M.Forster



Este clássico da Índia sob domínio britânico, considerado pela Time umas das 100 novelas em língua inglesa a ler, conta a história das (más) relações entre os britânicos e os indianos na Índia. Eles parecem não se chegar a cruzar, a não ser nas relações formais de trabalho, onde a altivez britânica persiste e oprime.
Este livro conta a história do médico Aziz, muçulmano – também ele com pouca vontade de se relacionar com os hindus do seu país (da sua nação?) –, que conhece duas britânicas e tem vontade de se aproximar delas, ser simpático, dar-lhes a conhecer a sua Índia, enfim, relacionar-se com pessoas, sejam elas alvas inglesas ou castanhinhas indianas.
Mas o peso da sociedade ganha mais força e vê-se envolvido numa perseguição alucinatória que o leva a tribunal para ser julgado por assédio por uma das inglesas. Pela outra continua a ter carinho, mas passa a desenvolver um asco e uma vontade de distância de tudo o que seja britânico. Mesmo depois de absolvido em tribunal pela retirada da queixa por parte da britânica (eram mesmo alucinações), muda de estado, para um governado pelos marajás, só para não ter que levar mais com os bifes.
Anos passados revive a história quando o seu amigo / inimigo Fielding se encontra de passagem pela sua nova morada. O diálogo final entre Aziz e Fielding é esclarecedor desta ambiguidade nos relacionamentos, daquilo que se quer a par daquilo que se tem por força do imperialismo.
“- De qualquer maneira, fora com os ingleses! Isso com certeza. Fora, amigos, fora, fora, já disse. Podemos odiar-nos entre nós, mas ainda os odiamos mais a vocês. Se não for eu a correr convosco será Ahmed, será Karim; nem que seja daqui a cinquenta ou quinhentos anos correremos convosco, sim, empurraremos todos os malditos ingleses para o mar, e depois…, depois – concluiu beijando-o quase -, você e eu ficaremos amigos”

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Pierre Loti - As Desencantadas



E porque a Turquia também é Ásia (e também é Europa), eis um livro que faz as vezes de elegia a Istambul.
“Istambul! Que sortilégio evocador nesta única palavra!... a cidade dos minaretes e dos zimbórios, majestosa e única, sem rival apesar da decrepitude irremediável, altaneiramente perfilada sobre o céu, com o circulo do Marmára fechando o horizonte”.
Este trecho de “As desencantadas”, do francês Pierre Loti, fala de Marmára mas o livro não se cansa de aludir a Pera e ao Bósforo, onde os endinheirados iam passar os meses de Primavera / Verão nas suas mansões à beira da água.
Loti está para os franceses assim como Kipling está para os ingleses e assim como ninguém está para os portugueses. O francês, oficial da marinha, viajou por todo o oriente e nele se inspirou em grande parte das suas obras.
“As desencantadas” narra a história de 3 primas turcas de Istambul que segundo a tradição da época são destinadas a casamentos arranjados e a viver para sempre num harém com as outras mulheres de seu marido. O que destoa aqui é a sua vontade em contrariar a tradição e a sua coragem e impetuosidade em insistir em encontrar-se com André, um escritor francês, para que este escreva as suas tristes vidas. Mas André – por quem tinham admiração enquanto escritor – acaba por significar muito mais para todas elas em geral e para uma delas em particular.
É ler até ao fim, por entre descrições entusiasmadas de Istambul e o destino trágico das mulheres de uma época.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Shìjiè - O Mundo



Vi o Shìjiè, O Mundo, de 2004, de Jia Zhangke.
Senti falta dos comentários ofegantes do professor de Cinema Asiático, uma vez que este filme estava no programa mas já não houve tempo de o apresentar durante as aulas.
Faço, no entanto, alguns comentários.
É passado num parte temático em Pequim, o Beijing World Park, onde podemos conhecer o mundo todo sem sair de Pequim: temos Paris nos arredores de Pequim, a Torre de Londres a dois passos daí e em Pequim ainda existem as suas próprias torres gémeas. Qual Las Vegas, qual quê? Pelos vistos desde 1993 que os chineses têm as suas próprias réplicas dos monumentos mais famosos do mundo.
Mas o delírio pára aqui. O filme é sério e relata o dia-a-dia e os relacionamentos entre vários artistas do Parque. Uns chineses que emigraram para Pequim, outros russos. Vidas difíceis, vidas contemporâneas.
Vale bem a pena dar uma olhada para entender um pouco mais da sociedade chinesa.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Huózhe - Viver



O filme Viver, de Zhang Yimou, foi considerado um dos melhores filmes asiáticos pela CNN. O seu realizador é também conhecido pelos “mais comerciais” Herói, Maldição da Flor Dourada e O Segredo dos Punhais Voadores. Para além disso, Zhang Yimou foi um dos criadores das cerimónias de abertura e de encerramento dos Jogos Olímpicos de Pequim de 2008.
Huózhe (Viver), de 1994, é um épico sobre uma parte da história chinesa, entre os anos 1940 e os anos 1970.
O personagem principal, Fugui, é nos mostrado inicialmente como um viciado no jogo, que perde as propriedades de família, incluindo a casa apalaçada e, com isso, a sua mulher (mais tarde reunir-se-iam). Depois de ter de sobreviver fazendo espectáculos de teatro de marionetas, é apanhado pelo Guomindang, o Partido Nacionalista. Durante a guerra civil, e graças ao seu talento com as marionetas, acaba por se integrar no Partido Comunista de Mao, o vencedor. Com os novos tempos vê que o melhor que lhe poderia ter acontecido no passado foi mesmo ter perdido as suas propriedades, uma vez que a nova ordem não só as passou a confiscar como enforcaria todos os grandes proprietários que a ela se opusessem.
Este filme narra a tragédia pessoal de uma família ao longo de décadas, passando pelo Grande Salto em Frente do final dos anos 1950, onde vemos as famílias a reunirem todo o ferro possível, mesmo maçanetas de baús, para se juntarem aos desejos de Mao, até à Revolução Cultural do fim dos anos 1960 e princípios dos anos 1970. Com esta, Fugui tem de destruir – sem qualquer oposição – as suas marionetas, uma vez que estas eram uma representação de uma tradição chinesa – o que a dita Revolução Cultural queria abolir a todo o custo.
Para o fim fica o murro no estômago. Como todos os médicos do hospital local haviam sido acusados de reaccionários, foram substituídos por estudantes e estagiários de medicina. A filha surda-muda de Fugui acaba por morrer logo a seguir ao parto de seu neto sem que haja outra reacção do pessoal médico para além de gritos atarantados.
Todavia, aquilo que é uma crítica comovente e cândida a um período da história chinesa termina com uma mensagem de optimismo, com o que resta da família reunida junto às sepulturas dos dois filhos mortos (o mais novo havia morrido bem cedo) com esperança num futuro melhor para o único neto.
Um filme imperdível e uma outra perspectiva da história.

sábado, 3 de setembro de 2011

Mouraria Chinesa

A Associação Renovar a Mouraria (http://www.renovaramouraria.pt/) tem estado a organizar uns passeios guiados à Mouraria Chinesa.
O ponto de encontro (com reserva antecipada obrigatória e limitada a pequenos grupos) é, como não podia deixar de ser, no Martim Moniz, junto à capela da Nossa Senhora da Saúde – ali mesmo em frente ao edifício caiado de branco da religião dominante em Portugal, com um mendigo à porta a quem uma velhinha que ia a entrar na igreja pede para lhe trocar umas moedas (sem que lhe dê esmola), e onde o bem lisboeta eléctrico amarelo passa incessantemente. Àquela hora da manhã ainda não leva muitos turistas. Mas cá fora, nas ruas, este grupo de 10 portuguesas (todas mulheres) aguarda enquanto ao seu redor vão passando chineses, africanos, indianos – ou talvez bangladeshes ou paquistaneses.
Esta será a zona mais multicultural de Lisboa e iniciativas como a desta Associação são bem-vindas para que possamos conhecer um pouco dos outros, daqueles que escolheram viver no nosso país, mas que na maior parte das vezes não vive connosco.
E, no que respeita aos chineses, como podiam, se vêm para cá para trabalhar, trabalhar e trabalhar?
Conhecida por ser uma comunidade fechada, esta visita guiada pretende desmistificar um pouco esta ideia e abrir-nos ambos, aproximando-nos.

O passeio começa no Centro Comercial da Mouraria, numa loja / bazar onde parece que se vende um pouco de tudo. A simpática empregada, que se esforça por ir perdendo a timidez à medida que responde às perguntas curiosas do nosso grupo, já saiu de Lisboa: foi a Tavira, a Óbidos, ao Gerês. Não é um caso típico. Mais típico será o seu agrado pela cidade que a recebe ter um clima ameno e, à noite, ser necessário um lençol para nos cobrirmos quando vamos dormir. Ficamos então a saber que tal é motivo de relevo, de encanto até. A maioria dos chineses em Portugal vem da província de Zhejiang, a sul de Xangai.



Saindo do centro comercial, mas mesmo aí perto, paramos depois num dos maiores e mais importantes supermercados chineses em Portugal, onde à entrada se vêem papelinhos com todo o tipo de informação, nomeadamente ofertas de emprego ou de casa – forma da comunidade comunicar entre si. A dona fala um português fluente e perfeito, o que não é muito comum.



Do outro lado da Praça fica o Centro Comercial Martim Moniz e a loja de um casal de antigos professores chineses onde podemos encontrar livros e artigos de decoração tipicamente chinesa, onde o vermelho predomina. Tivemos aqui direito a uma explicação acerca do funcionamento do ábaco que não há muito tempo vem sido substituído pela máquina de calcular.

Rua da Palma afora, metendo por um patiozinho onde está a ser construído um centro clínico para a comunidade, damos de caras com um cabeleireiro com um ar modernaço, mas ao mesmo tempo despojado. As fotos com modelos de penteados que se vêem em todos os cabeleireiros são aqui substituídas por modelos chineses. Mas os cortes da moda, certamente a imitar os ídolos do momento no outro lado do mundo, não são só para mostrar – a clientela, tanto chinesa como outra, faz questão de querer aqueles cortes prá frentex que se vêem nos cabelos fortes e espessos dos chineses.

Começando a subir a Av. Almirante Reis, na Rua dos Anjos fica a próxima paragem, o templo da Associação Taoista Portuguesa. Entre tentativas de ver as cores dos órgãos e das vísceras que navegam no nosso corpo, tentando levar um sorriso a cada uma delas, pernas cruzadas e olhos fechados, realizei que afinal há coisas piores do que ouvir rezar uma Avé-Maria inteira.



Adiante para a descoberta fantástica que se seguiu, providencialmente à hora do almoço. De volta à Rua da Palma, num 3.º andar de um prédio com uma varanda com uma vista soberba para algumas das colinas de Lisboa, com a Igreja da Graça e o Castelo em grande destaque, fica um daqueles restaurantes clandestinos (ou informal, talvez seja mais simpático a ele se referir, que bem merece) que se ouve falar que existem. Parece um apartamento normal, mas cada divisão tem uma mesa posta. A ementa é em chinês, mas a guia Joana atenciosamente levava um escrito com a descrição dos pratos em português.



Não precisava: podíamos comer de olhos fechados, estava tudo absolutamente saboroso e mais pratos viessem mais descobertas gastronómicas fantásticas teríamos. O preço é impublicável, de tão pornograficamente barato que é. Falta dizer que esta não é a comida chinesa que encontramos na maioria dos restaurantes chineses que por aí abundam; esta é a comida que os chineses desta região realmente comem, daí serem os próprios chineses a maioria de clientes deste restaurante.
Experiência a repetir, certamente.


quinta-feira, 7 de julho de 2011

A Índia vista por ocidentais

Apenas a indicação de uns livros muito bons sobre a Índia na perspectiva de autores ocidentais, com as suas visões e sensações muito próprias:



Uma ideia de Índia, de Alberto Moravia, e
O cheiro da Índia, de Pier Paolo Pasolini – apontamentos sobre a viagem que os dois italianos fizeram juntos pela Índia nos anos sessenta.



Vislumbres da Índia, de Octavio Paz – nos anos cinquenta e sessenta o mexicano foi primeiro funcionário e depois embaixador do seu país na Índia.

Comboio para o Paquistão



Khushwant Singh é um autor indiano nascido em 1915 (e ainda vivo) em terras do Punjab hoje paquistanês.
O seu livro “Comboio para o Paquistão”, escrito em 1956, fala de forma brilhante e evocativa, bela mas duramente, dos momentos que se seguiram à partilha da Índia britânica em 1947, cuja forma atabalhoada geradora de incerteza conduziu não só a migrações de milhões como à morte de um sem número de pessoas.
Singh escreve logo na primeira página “Os muçulmanos diziam que tinham sido os hindus a planear e a começar a matança. Segundo os hindus, a culpa era dos muçulmanos. A verdade é que ambos os lados mataram”. A estes há ainda que acrescentar os sikhs que, tal como os outros, provocaram e foram provocados.
A cidade de Mano Majra, fronteiriça entre a Índia e o Paquistão, é palco da história, por onde passam os malditos comboios, por vezes com vivos, outras vezes com cadáveres, sempre a abarrotar.
Outro trecho “Quando vinham, estavam apinhados de refugiados sikhs e hindus vindos do Paquistão, ou muçulmanos vindos da Índia. As pessoas vinham empoleiradas nos tejadilhos com as pernas balançando na borda, ou em armações de cama apertadas entre os vagões. Algumas vinham precariamente cavalgando os amortecedores entre as carruagens.”
Uma outra passagem lindíssima escrita por este autor é a dedicada à monção, com ela “o ritmo da vida e da morte aumenta”, a de inverno “é como um aguaceiro frio numa manhã de geada, que deixa as pessoas frias e estremecendo”; a de verão “é sempre precedida por vários meses em que a terra vai ganhando sede, pelo que, quando as águas vêm finalmente, são bebidas sofregamente e com prazer”.
No meio de tanta tragédia, a leitura deste livro consegue-nos encantar e, sobretudo com o seu surpreendente e corajoso final, fazer-nos acreditar e ter esperança nos homens, ou pelo menos em alguns.

O Cinema de Johnnie To

Johnnie To, que eu desconhecia em absoluto que existia ou sequer fazia filmes, foi o que mais me surpreendeu.
Ainda por cima, os seus filmes de acção são policiais, com gangsters, armas e algumas artes marciais. Algo que à partida eu diria: não, obrigada.
Mas… o que acontece é que a violência que decorre desta acção é esteticamente bela, uma espécie de ópera com acrobacias, um ballet. Nem precisam de ser disparados muitos tiros, basta a forma como as personagens se mexem, a forma como elas vão aparecendo duplicadas por entre os espelhos, para ser tudo muito apelativo. O uso contínuo do slow-motion faz as cenas durarem mais e vemos os corpos suspensos no tempo, numa coreografia que, de todo, não esperava em filmes de acção.
Adorei Johnnie To, está visto.
E adorei especialmente a forma como ele elege o grupo como o herói dos seus filmes. Não há um herói isolado, individualizado, antes um conjunto de homens – sempre homens – que se encontra em crise face a um dilema entre dois deveres: o da fidelidade ao seu grupo que muitas vezes já vem de infância e o da fidelidade ao chefe da máfia.
Johnnie To é de Hong Kong e os filmes decorrem maioritariamente ai, em especial na península de Kowloon, ou em Macau. Para quem aqui viveu no tempo dos portugueses deve ser lindo voltar a ver as suas ruas e os carros com matrícula portuguesa como no caso de “Exiled”.
E, depois, a música que acompanha as cenas dos seus filmes é certeira para nos transportar para aquele ambiente, e ai se podem ver influências e uma pequena homenagem aos westerns, principalmente de Sergio Leone.
Johnnie To já caracterizou os seus filmes como exercícios em que vai procedendo a uma experimentação constante. Pois bem, os exercícios dele a que me dediquei até à data foram “The Mission (1999), “Exiled” (2006) e “Sparrow” (2008).



Começando pelo último, “Sparrow” é uma pequena maravilha, foi o filme que mais me entusiasmou. É sobre um grupo de carteiristas simpáticos e tão discretos que o roubo das carteiras não devia dar direito a uma pena mas antes a um bilhete para se assistir a um espectáculo, tão belos que são os seus gestos. Mas eis que surge uma mulher que será comum a todos os elementos do bando e parece que irá conseguir separar os amigos. Mas, como disse ao início, o herói é o grupo.



Em “Exiled”, o tal passado em Macau, o grupo é composto por amigos de infância, sendo recorrente a imagem da fotografia deles em pequenitos e depois uma outra fotografia deles mais velhitos. A primeira cena é a de um tiroteio em que, por acaso e sem querer, aparece um polícia português que se irá reformar já no dia seguinte e a quem não interessa nada ser apanhado no meio daquela confusão. Vai daí, telefona ao chefão da máfia para este pedir aos seus gangsters que o deixem sair dali ileso. Uma espécie de ironia zen de Johnnie To, recorrente nos seus filmes. A esta ideia de acaso deve ser juntada a ideia de fatalidade e de tempo, bem expressa na última cena do filme, na filmagem do último combate, o qual dura o exacto momento que uma lata demora a cair. E morrem todos.



O “The Mission” tem mais uns quantos tiros. É sobre um chefe da máfia que, assustado, contrata 5 elementos para o protegerem. Estes, desta vez, não se conhecem à partida, mas a sua relação torna-se tão forte que se tornam amigos e fazem brindes à sua amizade. Quando um deles começa a ter um affair com a mulher do chefe mafioso a sua morte é encomendada. Os amigos reagem, mas com isso põem em causa também as suas próprias vidas (dos restantes 4). Mas do que me vou lembrar neste filme é da cena passada no centro comercial, por entre escadas rolantes e espelhos, onde os inimigos se encontram. Há tiros, mas parece um bailado. Com música a propósito a acompanhar, calma, um toque suave. Noutra cena, o grupo de amigos joga à bola com uma bolita de papel, trocando passes enquanto esperam pelo patrão.
Estes filmes de Johnnie To são um autêntico hino à amizade.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O Cinema de Wong Kar Wai

De Wong Kar Wai (WKW) já tinha visto “In The Mood for Love” –“Disponível para Amar”, de 2000, e “My Blueberry Nights”, de 2007. Este último, recente, ainda tinha na memória, e lembro que gostei. E lembro, sobretudo, da sua música, principalmente o “The Greatest” de Cat Power.



Agora revi “In The Mood for Love” e vi “Chungking Express”, de 1994, e “Happy Together”, de 1997.
E fiquei a saber que a música não é um elemento de somenos em WKW. Aliás, ainda que ele se dedique a vários géneros, o melodrama, um desses géneros, é isso mesmo – um drama musical. E encontramos música do mundo, por exemplo Nat King Cole a cantar o Quizás em espanhol em In The Mood for Love.
Esta é apenas mais uma prova da multiculturalidade e cosmopolitanismo dos filmes de WKW. Por exemplo, este filme é passado em Hong Kong, mas filmado em Banguecoque, Tailândia, procurando recriar a Shanghai dos anos 50/60 da infância do realizador, e termina em Angkor Wat, Camboja. Chega? Ok, Chungking Express trata de Hong Kong. Mas Happy Together é passado na Argentina. E My Blueberry Nights rola em vários locais dos Estados Unidos da América.
Temas recorrentes em WKW são a questão da cidade, da modernidade e da identidade. A questão da migração, também, com o sujeito em crise – o que acontece em todos estes 4 filmes.



Chungking Express são duas histórias separadas dentro do mesmo filme. Dois policias numa Hong Kong frenética. A sequência inicial do filme, em slow-motion e acompanhada com uma música que lá encaixa na perfeição é imperdível. Sempre com um ritmo acelerado, relógios presente, comida presente, o dia a dia certeiramente retratado na confusão da grande cidade de Hong Kong. É um filme fantástico.



Happy Together gira à volta de um casal de homens de Hong Kong que vão até a Argentina tentar salvar a sua relação instável. Um deles tinha um daqueles objectos que se encontram nas lojas chinesas e de recordações fatelas com a imagem das cataratas de Iguazu e eles tentam lá chegar de carro – em vão. Dividem-se, mas voltam a encontrar-se. Um tenta arranjar trabalho – o actor Tony Leung Chiu-Wai, (quase) sempre presente nos filmes de WKW – e o outro nem por isso. Mas ambos desejam voltar para o seu país. Muito bom este filme.



In The Mood for Love é muito bonito. Há aqui uma nostalgia do passado (já “2046”, que não vi, é a outra parte do puzzle, uma projecção do futuro) que juntamente com a música, que surge como interlúdio para as cenas da relação entre os dois amantes, nos descontrai em absoluto e nos faz encantar. Este filme trata de casamento e fidelidade. Da relação entre o Sr Chow e a Sra Chan, uma relação baseada na reserva e no desejo reprimido e baseada também no suspense – será que eles dormiram juntos ou não? Levaram a sua relação até ao fim ou não? O que é que o Sr Chow sussurrou nos templos de Angkor na cena final?
Tudo aqui é lindo. Os vestidos da Sra Chan, os encontros dos amantes, os seus diálogos, quer enquanto caminham pelas ruas, quer enquanto estão à mesa, a comer. E a cena do fumo do cigarro que se perde no ar, não sem antes formar uma sombra que se confunde com a própria música. E pensar que provavelmente em 2000 adormeci no cinema a ver e a ouvir esta maravilha.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Dengue Fever



Deixando um pouco os filmes de lado, e aproveitando um novo cd da banda, apresento Dengue Fever.
Banda americana com vocalista cambojana, mistura o inglês com o khmer, o folk com um rock futurista.
Ainda não consegui ouvir o novíssimo "Cannibal Courtship", mas a banda tem mais albuns e o "Venus On Earth", de 2008, é simplesmente fabuloso. Não entendo nada do que dizem, mas aqueles iong iong soam-me muito bem.
Há ainda um documentário de nome "Sleepwalking Through The Mekong" em que a miúda da trupe volta ao seu país junto com os amigos americanos que um dia se encantaram pelo país de Angkor.
Não vou conseguir descansar enquanto não sacar a nova música da net.

“Realismo documental”

E porque não é só de ficção que se faz o cinema, eis aqui mais dois exemplos.



O primeiro o de um filme antigo, de 1972, que se pretendia comprometido com Mao Tse Tung e a Revolução Cultural, mas que afinal veio a ser acusado de outra coisa: Chung Kou ou Cina, um documentário de Michelangelo Antonioni.
O italiano era um realizador assumidamente de esquerda e foi convidado pelo governo chinês da altura para filmar a nova China – seria um dos primeiros actos de abertura do país e a primeira vez que os olhos ocidentais poderiam vê-lo.
Mas Antonioni não se limitou a mostrar aquilo que os sempre presentes guias queriam que ele mostrasse e a propaganda anti filme não tardou a ser despoletada. Para se ter uma ideia, só em 2004 este filme veio a ser oficialmente mostrado na China.
Aos meus olhos, não tem nada de mais, nada que possa colocar assim tão em causa o regime chinês de então. Mostra as crianças e os seus pais operários em plena ordem, dançando e ouvindo música – de apologia a Mao –, praticando desporto, marchando, indo para o trabalho alegremente. Mas mostra também os mercados não oficiais, onde tudo se vende e tudo se compra, e mostra ainda, numa fuga autorizada mas não aceite, uns outros edifícios de casas e escolas não tão conservados e confortáveis como aqueles que a princípio seria desejável mostrar-se. Para se ter uma ideia das “desculpas” inventadas para denegrir o filme, Antonioni foi acusado de filmar os rostos e gestos das pessoas, individualmente falando, logo numa China em que o colectivo é rei. E foi acusado de filmar a moderna ponte sobre o Rio Yangtze, em Nanquim, sob um ponto de vista em que a mostrava escura e torta. Nem adiantou argumentar que o dia estava carregado de nuvens.
Enfim, Antonioni foi apanhado num momento em que a oposição interna e externa ao Partido Comunista Chinês corria solta e acabou por servir como instrumento para aqueles que queriam conservar o poder.

Outro exemplo é o do realizador chinês Jia Zhang-ke, este nosso contemporâneo. Os seus filmes não são bem documentários, mas não andam longe disso e a preocupação com o real e os problemas da actualidade marcam presença forte no seu cinema. É como que um género que pode ser designado por realismo documental.



Jia foi aclamado pelo filme Still Life, considerado um dos melhores filmes asiáticos de sempre e premiado com o Leão de Ouro no Festival de Veneza de 2006. O filme trata da questão – real – da construção do Three Gorges Dam, uma barragem hidroeléctrica no rio Yangtze que implicou a inundação e correspondente desaparecimento de inúmeras vilas e aldeias. Como na China é tudo em grande, tiveram que ser deslocados mais de um milhão de habitantes. No filme um individuo volta para procurar a sua ex-mulher e filha, que não vê há anos.



O outro de Jia que vi foi o Xiao Wu, o seu primeiro filme, de 1998. Gostei mais deste, não tão parado, conta a história de um ladrão de carteiras habilidoso, mas que vai perdendo a consideração dos amigos e da família. Interessante nestes filmes é a presença da música, uma constante, seja no rádio, seja na televisão, a música popular faz-se ouvir.
Outro filme muito bem recebido de Jia é o The World. Mas quanto a este, ainda tenho de ganhar coragem para me dedicar às duas mais de 2 horas.

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Teatro Noh

A amizade entre o Japão e Portugal já vem de longe, tem muitos séculos mesmo. Mas foi apenas há 150 que ela foi formalizada através da assinatura de um tratado entre os dois países. E para comemorar o feito, o Teatro D. Maria II apresentou na semana passada duas peças do teatro Noh, “Auto da Barca da Viagem” e “Sorin”, trazidas até nós pelo grupo Sakuramaki.



Graças a Literaturas Asiáticas fiquei a saber que o teatro Noh, a par do Kyogen e do Kabuki, são estilos de teatro característicos do Japão.
Para concentrar apenas no Noh, este vem desde cerca o século XIV e é uma espécie de ópera concentrada no cantar e dançar. Há um acompanhamento por parte de uma orquestra ou de um coro. O cenário é despojado e há um mínimo de ênfase nos movimentos do actor principal – sempre com uma máscara que vai mudando conforme a personagem que se quer representar – e nas suas palavras, mas o máximo de ênfase na imaginação da audiência. O palco para apresentação desta peça dramática é normalmente de madeira, para permitir ao actor ir deslizando e executando os seus gestos e movimentos como se fosse uma onda, em que o movimento transmite sentimentos.
Sentimentos e imaginação.
Bonito, não é? Apelativo, não é?
A professora avisou, repetiu, insistiu: que não percebia nada do Noh.
Eu tentei. Fui ver o Sorin e, pese embora as boas intenções para buscar um qualquer sentimento profundo de flor a desabrochar, fosse de cerejeira ou não, nenhuma imaginação me atingiu.
No entanto, não dei por mal empregue o tempo: fiquei curiosa em saber se todos os noh nos impedem de imaginar seja o que for.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Cinema Chinês

Quanto a filmes chineses, deixarei Wong Kar Wai e Johnnie To, os meus dois preferidos, para post autónomo.



Comecei por ver um filme de Wu Yonggang, “Shen nu” (The Goddess), de 1934. Penso que não poderia haver começo mais cativante para trazer expectativas quanto aos outros filmes que haveriam de se lhe seguir. É um filme mudo com uma actriz fabulosa de nome Ruan Lingyu que se matou cedo. Os tormentos que terá tido em vida com as suas relações amorosas passa-os também na fita. Representa uma mãe prostituta. Os homens que aparecem no filme são todos uns crápulas, com o seu chulo à cabeça, à excepção do professor da escola, que ficará encarregue da educação do seu filho.



E para algo completamente diferente seguiu-se Zhang Yimou, “Herói”, de 2002. Fez um enorme sucesso na China e um pouco por todo o mundo (os filmes deste realizador são um bocado conhecidos e premiados no ocidente, como “To Live”, de 1994, “O Segredo dos Punhais Voadores”, de 2004, e “A Maldição da Flor Dourada”, de 2006 – todos filmes ainda para eu ver). Herói é um filme de artes marciais, o wuxia. Mas daqueles que remetem para imagens do maravilhoso e do fantástico. Interessante achei a querela que aconteceu na China com a interpretação, do ponto de vista político, deste filme. Houve quem dissesse que se queria fazer passar uma esponja no autoritarismo (do imperador) para justificar um certo modelo politico contemporâneo, como se Zhang Yimou fosse o realizador oficial do regime (ele que também esteve presente na concepção da parte cénica dos JO de 2008).
Depois de 9 em cada 10 colegas já terem visto ou ouvido falar do filme, confesso que estava muito ansiosa e curiosa. Mas, apesar de ter gostado da cor e dos cenários, não achei que fosse assim tão brilhante.



O que eu achei lindo e soberbo, sim, foi o Red Cliff, de John Woo, de 2008. John Woo é o mesmo da Missão Impossível II e conseguiu com Red Cliff mais destaque e sucesso do que qualquer Missão Impossível. Foi um sucesso de público e de crítica. É a história verdadeira da batalha de Red Cliff que aconteceu no fim do domínio Han na China, por volta do século III a.C. O que mais me impressionou, para além dos cenários e paisagens fabulosas, foram as estratégias utilizadas por Zhuge Liang para vencer o reino do norte.
E impressionou-me ainda mais Takeshi Kaneshiro, o actor meio japonês meio taiwanês que representa aquela personagem histórica, a entrar directamente no meu top de homens asiáticos mais lindos.

Cinema Japonês

No cinema japonês vi pela primeira vez um filme de Yasujiro Ozu, “Tokyo no Yado” (Uma pousada em Tóquio), de 1935. É um filme mudo mas muito interessante, sobre a vida dura de um pai com dois filhos à procura de emprego.



Vi também pela primeira vez um filme de Akira Kurosawa, “Ikiru” (Viver), de 1952. É a história de um homem empregado numa repartição que leva uma vida desinteressante entre papelada até ao dia em que descobre que tem apenas uns quantos meses de vida. E resolve começar a viver. Por exemplo, a sair para beber e a dar-se com mulheres mais novas, tudo com a maior das ingenuidades e sem loucuras. Ou, outro exemplo, a preocupar-se com a comunidade e a dar finalmente a ordem que havia ignorado enquanto chefe da repartição para se construir um jardim infantil. É um filme essencial, aqui ou na China. Ops! Aqui ou no Japão.



Vi ainda um filme de Nagisa Oshima, “Seishun Zankoku Monogatari” (Contos Cruéis da Juventude), de 1960. Dele já tinha visto o “Império dos Sentidos”, o tal que já falei em post anterior que fez furor na nossa televisão nos anos oitenta. Este filme não tem erotismo, mas tem já uns beijos roubados e uns corpos nus que seriam um bocado afoitos para a época. É a história de uns adolescentes transviados, rebeldes, que querem aproveitar a vida e o sol, gostam dos seus corpos e que armam uns esquemas com um bocado de imaginação para sacar dinheiro aos cotas que se deixam enganar pelas supostas boas intenções das damas. Mas, é claro, as coisas não acabam bem para esta juventude do pós guerra.

O único filme dos que vi que não gostei grande coisa foi o de Kenji Mizoguchi, “Ugetsu Monogatari” (Contos da Lua Vaga), de 1953. É a história de uns fulanos que vão para a guerra (um deles está maluquinho por vir a ser samurai) e voltam como fantasmas. É um dos filmes japoneses mais aclamados, para ver que nem todas as coisas boas são do meu agrado.



Depois, por fim, um filme de Hideo Nakata, “Honogurai mizu no soko kara” (Águas Passadas”), de 2002. É também sobre fantasmas, mas moderno. Deste já gostei mais. Há também uma versão de Walter Salles passada no Canada. É a história de uma mãe divorciada que cria sozinha a filha, sempre com medo de que o pai lhe venha a ganhar a guarda. Muda de casa e, oh cúmulo dos azares, vai logo para uma que mete água porque a menina que tinha morrido afogada no reservatório de água do último andar não pára de chorar porque se sente abandonada. Parece que a água, no imaginário japonês, está ligada à morte e aos fantasmas. Vou ser desmancha prazeres e contar o fim: a alucinação é que esta mãe acaba por – para apaziguar a vida atormentada que passa a viver – escolher a menina fantasma em detrimento da sua própria filha. Impressionante. Muito bom.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Alguns filmes do Vietname e Camboja

Já conhecia uns filmes que adorei de um realizador vietnamita, de seu nome Anh Hung Tran.



São eles Cyclo (1995) e The Scent of Green Papaya (1993).
O primeiro é um bom retrato de um jovem condutor de bicicleta que transporta pessoas pelas ruas de Saigão mas que, para ganhar dinheiro, acaba por se envolver com criminosos. Não é um filme leve, mas como diria o outro, é espantoso!
O Odor da Papaia Verde é simplesmente lindíssimo, de uma sensibilidade tocante, nem era preciso o som do piano.



E, depois, há O Amante (1992), que não é de Anh Hung Tran nem de nenhum vietnamita (é de um realizador francês), mas é uma adaptação do livro de mesmo nome de Marguerite Duras, a francesa que viveu toda a sua infância e adolescência na Indochina. Este filme também é bom e não esquece de filmar os encontros dos amantes no bairro de Cholon (entre quatro paredes), que Duras conseguiu tornar mítico.
Não sei se gostei tanto destes filmes por os ter visto na sequência de uma viagem ao Vietname, com a vida acelerada das ruas e as cores e os cheiros dessa Ásia bem presentes. Mas já tinha lido O Amante e fizemos (eu e a mana) questão de ir até Cholon, a alguns quilómetros da antiga Saigão, hoje Ho Chi Minh City. É a maior confusão por lá, seja no mercado seja nas ruas, que são também elas um mercado interminável e constante. E, depois, é inesquecível – porque tudo faz parte – a pobreza imensa das casas de latão junto ao canal nojento. Pois é, nem todas as águas têm o encanto do Mekong, mas se não se quer levar assim a seco um murro no estômago pelo contacto directo com a realidade, talvez começar por ver estes filmes seja uma boa ideia (apesar de que dos citados, apenas Cyclo pode ser considerado algo violento; O Amante só chocará pela “libertinagem” e decadência de uma família que supostamente faria parte da classe dos colonizadores).
No entanto, o filme O Amante não terá sido filmado em Saigão, mas em Sadec, no delta do Mekong, onde Duras também viveu.
E há ainda outro filme de uma adaptação de uma obra de Duras: Un Barrage Contre le Pacifique (2008), do cambojano Rithy Panh, que eu ainda não vi.
Assim como do mesmo autor ainda tenho para ver – espero que bem antes do Natal – The Rice People (1994), Un Soir Aprés la Guerre (1998) e, quando o conseguir sacar, S-21, la Machine de Mort Khmere Rouge (2003), todos sobre a tragédia e o trauma criados pelo Khmer Rouge de Pol Pot que assolou o Camboja nos anos 70.



Sobre esta temática tive a oportunidade de ver o mais antigo e famoso Killing Fields (1984), dois jornalistas que cobrem as atrocidades daquele regime: o americano safa-se, o cambojano vai parar aos campos da morte.



E, voltando ao Vietname e às adaptações, fica a faltar falar do Americano Tranquilo (2002), talvez destes todos o filme que mais sucesso fez, baseado no livro de Graham Greene, um triângulo amoroso em Saigão, com muita traição, passado no começo da guerra do Vietname.

O Cinema

Mas o que eu gostei mesmo muito neste segundo semestre foi a cadeira de Cinema Asiático.
As constantes tiradas e qualificativos de “espantoso” do professor galvanizaram, ai isso é que galvanizaram.
Confesso que ao princípio fiquei um pouco desiludida ao saber que este cinema “asiático” se iria resumir a China (incluindo Hong Kong) e Japão. Nada de Índia nem do seu Bollywood.
Mas nem por um momento, nem antes nem depois, pensei que seria uma perda de tempo ter uma cadeira de cinema e, a partir de certa altura, assistir a um filme todas as 5.as feiras de manhã.
Não porque seja uma grande cinéfila, longe disso. Mas porque gosto de boas histórias, gosto de filmes não americanos (e também gosto destes), não me pelo por blockbusters (embora viesse a descobrir que também os chineses os têm, como Hero e Red Cliff – o Tigre e o Dragão já tinha visto) e, principalmente, sou curiosa, gosto de descobrir coisas, sejam filmes, sejam músicas, sejam países.
E ver o cinema de diferentes países é uma boa forma de tentar conhecê-los e entendê-los um pouco.
Resultado: de tanto sacar filmes destas paragens tenho programa para todas as 6as feiras e sábados à noite até ao fim do ano.

terça-feira, 31 de maio de 2011

Benazir

Em Economias e Sociedades da Ásia Contemporânea, escolhi apresentar (check!) um trabalho sobre Benazir Bhutto, a minha ídola preferida, do país da Ásia por quem sinto mais interesse - o Paquistão (serei normal?).
Dei-lhe o nome de "Benazir Bhutto: o poder hereditário e no feminino".

Eis o resumo da coisa:

«Benazir Bhutto, a primeira mulher eleita para governar um estado islâmico, o Paquistão, em 1988, era ela própria filha de um antigo presidente e primeiro-ministro do mesmo país. Educada nos Estados Unidos da América e em Inglaterra, inteligente e carismática, capaz de juntar milhares de pessoas tanto nos seus dois retornos do exílio, como nos seus comícios, foi deposta antes do fim em ambos os mandatos que ganhou. Terá o facto de ser filha de um outro político carismático, herdeira de uma família feudal proprietária de terras, líderes de um clã – os Bhutto – na província de Sindh, em resumo, terá a hereditariedade dinástica, contribuído para a sua ascensão ao poder? Ou terá o facto de ser mulher sido uma vantagem ou uma desvantagem no seu percurso politico? E, sendo mulher, enquanto no governo terá prosseguido politicas femininas?»



Pelo caminho descobri que existia um filme de 2010 de nome "Bhutto".
Aqui aparece Benazir no seu famoso discurso efectuado no Congresso dos Estados Unidos, em 1989, onde diz que "Democracy is the greatest revenge", e não "Democracy is the best revenge", como disse o seu filho Bilawal.
E ouvimos a sua voz nesta confissão extraordinária de uma mulher que adorava discursar para as multidões:
“When I get up to speak, I usually start slowly, and then I build up. I look at the people, because when I look at them, then I can feel that strength running through my body. I feel strong, I feel more determined and I feel that when I have this strength with me, then I can move any mountain. It just seems to me that as I looked out, I just saw a sea of humanity. That the fight for the truth is important. Because the day that does come when you see the response to your struggle”

Mais Kawabata

Isto agora com Bolonha faz com que os cursos tenham só cadeiras semestrais.
O problema é que são uns 3 meses de aulas no primeiro semestre e mais uns 3 meses e meio de aulas no segundo semestre.
Ou seja, é sempre a abrir e para o fim ficam as avaliações - sem exames, a avaliação é contínua, mas tudo é deixado para o fim, quer pelos alunos, quer pelos professores, que marcam os testes e as entregas de trabalhos todos para a mesma altura.
O que me safou foi que consegui despachar o trabalho sobre o Kawabata, da Introdução às Literaturas Asiáticas, nas férias da Páscoa e foi menos um para deixar para entregar para fim de Maio / princípio de Junho.

Eis o resumo / introdução:

«Yasunari Kawata, primeiro japonês laureado com o Nobel da literatura, em 1968, dedicou a sua vida literária às novelas, contos e ensaios.
Marcado pela dor da orfandade desde muito cedo, os traumas do crescimento sem pai e sem mãe marcaram-no ao longo da sua vida. Na sua obra essas marcas são igualmente visíveis nos temas que desenvolve (infância, sonho, solidão, morte, imortalidade, suicídio), em especial nos seus contos. Palm-of-the-Hand Stories é uma colectânea dos contos escritos por Kawabata ao longo dos anos, desde 1923 até 1972, alguns deles publicados já após a sua morte, por suicídio.
Nesta recensão critica procurar-se-á descrever, analisar e caracterizar alguns dos aspectos e influências da escrita de Kawabata, designadamente nos contos “The Silverberry Thief”, “Summer Shoes”, “A Child´s Viewpoint” e “Love Suicides”, todos escritos na década de 20 do século XX e constantes do livro acima citado.»

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Kawabata

Ando para aqui às voltas com um trabalho para literaturas asiáticas sobre uns contos de Yasunari Kawabata.
Só me vêm à cabeça as palavras estranho e paranóico, mas acho que estes não são termos que se possam utilizar num trabalho académico de literatura.
Vou continuar a tentar qualificar o nobel japonoca de uma forma mais exacta.

domingo, 10 de abril de 2011

Júbilo

O professor de Cinema Asiático vive as aulas, com explicações e comentários aos filmes entusiasmadas. Eu gosto. E é isso mesmo que espero quando ouço falar de um tipo de cinema ou quando vejo um filme numa aula.
Ao falar da fase do cinema de Hong Kong, entre as décadas de 60 e 70 do século passado, aquela em que Bruce Lee irrompeu com os seus filmes de kung fu, lembrou as cambalhotas sobre cambalhotas que eram o prato forte.
Não consegui conter uma gargalhada – e estou até agora com um sorriso enorme no rosto – pela expressão por si utilizada para descrever o contributo destas cambalhotas para as características destes filmes: “é um puro júbilo da forma!”
Ah! (o ah! é meu).

sábado, 9 de abril de 2011

Greves

As greves do metro têm calhado todas às 3.as e 5.as de manhã, bem na hora da aula de japonês.
A professora tem-se mostrado compreensiva. Começou por não marcar faltas, adiar o teste que estava marcado para um desses dias, não avançar na matéria, coisas do género.
Mas as greves nunca mais acabam. E são sempre nestes dias. E os alunos faltam muito. Muitos.
Vai daí, e para “poder compreender a realidade e distinguir as faltas dos que tenham a verdadeira razão para as ausências”– vulgo, para ver quem falta pelo metro ou para ficar a dormir mais um pouquinho – a professora enviou um e-mail a pedir-nos para justificarmos o facto, “indicando a morada e a estação onde costuma apanhar o transporte e explicando as razões que o impedem de comparecer nas aulas”.
Não consigo parar de imaginar a Kioko em frente ao Google Earth e com a página da Carris aberta a ver cada uma das nossas moradas e as carreiras dos autocarros que melhor nos trazem à faculdade.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Literaturas Africanas de Língua Portuguesa

Esta é uma cadeira de opção livre. Foi um tiro certeiro. Adorei as aulas, as leituras, as descobertas.
Pepetela passou a ser quase um Deus para mim, não pelos contos que li dele, mas pela sua Geração da Utopia. Soberbo.
João Melo é um contista entusiasmante, com um humor, uma ironia e um retrato da sociedade luandense mordaz mas verdadeiro.
A escrita de Ondjaki é bela, influenciada pela oralidade, no contar de histórias que ainda hoje marca África.
Mia Couto brinca com as palavras como quer e é um divagador nato.
E, depois, a descoberta na aula de mais alguns autores, como Luís Bernardo Honwana e Gabriel Mariano.
E, já em casa, no final, aquilo que me parece que se pode considerar uma cadeira bem sucedida numa faculdade: o despertar a vontade nos alunos para descobrirem mais autores. Foi um prazer ler o unânime Luandino Vieira, bem como Manuel Rui e Paulina Chiziane.

História da Expansão Europeia na Ásia

Esta aula será especialmente recomendada para quem quer por o sono em dia.
Já em casa, gostei muito de ler os artigos do prolifico Luis Filipe Thomaz sobre o tema – o expert sobre o assunto ao lado de C.R.Boxer.
E adorei descobrir o livro “Lavrar o Mar”, de Luis Filipe Barreto. Não pela forma como está escrito, mas pela edição da Comissão para os Descobrimentos com imagens lindíssimas. E o nome… Lavrar o Mar, toda uma inspiração.
Para trabalho final da cadeira desenvolvi o tema da presença dos missionários portugueses no Camboja, em especial em Angkor. O pretexto era óbvio: voltar a Angkor, recordar a beleza dos seus templos e os bons momentos que por lá passei séculos depois de um missionário português ter sido o primeiro europeu por aquelas paragens. O seu nome era Antonio da Madalena, era franciscano, esteve por lá em 1586 e o cronista Diogo do Couto relatou as suas impressões deslumbradas.

Fontes e Métodos dos Estudos Asiáticos

Cadeira obrigatória, mas ninguém sabe muito bem o que fazer com ela.
Sobretudo os professores.

Geografia da Ásia

Uma aproximação às questões ligadas não à geografia física, mas antes à humana, como vivem, o que condiciona a vida, porque se distribuem assim e não assado as populações na Ásia.
Gostei muito.
O trabalho escolhido, de entre aqueles temas colocados à nossa disposição pelo professor foi o mais próximo que arranjei de um pretexto para pesquisar e escrever sobre o Paquistão: a indefinição das fronteiras nos Himalaias.
Para além de Caxemira, disputada entre Paquistão e Índia, fiquei a saber que a mesma Índia e a China disputam o Aksai Chin e o Arunachal Pradesh e que a mesmíssima Índia e o Nepal disputam mais uns quantos territórios, para além das questões entre do Tibete / China e de disputas de terras entre estados dentro da própria Índia.
Interessante concluir que estas disputas se devem não só a rivalidades entre os países e a uma falta de clareza na marcação das fronteiras, quer no terreno quer em mapas, por parte dos britânicos que dominaram a região até há 60 e picos anos, mas, sobretudo, a uma disputa pelos recursos naturais: água e energia. Os rios que nascem nos Himalaias correm por vales muitíssimo férteis e quem tem água, tem agricultura, tem comida, tem vida, tem alguma coisa.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Japonês

3.ªs e 5.ªs comecei e continuo a dedicar-me ao japonês logo às 8:00 da manhã.
Em tempos andei com a pancada de aprender russo, depois espanhol, e agora, sem que nunca tenha pensado nisso, vejo-me com o japonês. A escolha preferida teria sido o árabe, persa ou hindi – a minha área geográfica da Ásia – mas… os horários.
Logo na primeira aula apanhei o primeiro “choque”: os colegas pitinhos sabiam quase todos dizer alguma coisa em japonês, alguns muita coisa, e eu tive dificuldade em relacionar que ohayo gozaimasu é bom dia.
Mas, com alguma dedicação as coisas compuseram-se e tenho acompanhado bem. Não consigo, no entanto, imaginar-me a dominar esta língua de forma a travar um diálogo de jeito durante algum período da minha vida.
São três alfabetos: o hiragana (para palavras japonesas e partículas), o katakana (para estrangeirismos) e o kanji (uma adaptação dos caracteres chineses e que com eles se confunde).
De kanji nada sei. Tenho de me despachar, portanto, porque quase tudo o que se escreve é utilizando esta forma e são SÓ cerca de 4000 / 5000 kanjis e com uns 2000 é que uma pessoa se safa para ler jornais e revistas.
Parece que com o chinês é pior, pois os tons e as nuances dos tracinhos nos caracteres mudam por completo o sentido da coisa. Ainda assim, espero para o ano conseguir ir aprender também o chinês.

1.º Semestre

Um breve balanço do 1.º semestre, que já lá vai e que lá vai muito bem.
Este curso de Estudos Asiáticos vai apenas no seu terceiro ano, daí que pela primeira vez possua finalistas.
Dominam, claramente, as matérias relacionadas com a China, o Japão e a Índia. O resto é (quase) paisagem.
Entre cadeiras de arte, literatura, cinema, religião, filosofia e história encontramos um curso bastante virado para as línguas – só para se ver, das cinco cadeiras semestrais, duas terão de ser línguas para se concluir o curso logo em três anos.
Dada a conciliação dos horários da faculdade com os do trabalho, fiquei-me apenas pelo japonês.
As outras cadeiras foram:
Geografia da Ásia;
Fontes e Métodos dos Estudos Asiáticos;
História da Expansão Europeia na Ásia;
Literaturas Africanas de Língua Portuguesa.

As Minhas Gerações

Voltar à faculdade 18 anos lectivos depois é encontrar todo um outro mundo, toda uma outra geração.
A primeira diferença é a solidão. Pois é, sou a única Susana. Em tempos antigos éramos meia dúzia, mais não sei quantas Sandras e Sónias. Estas últimas ainda resistem.
Mas agora há também as Jéssicas, Andreias, Danielas e Brunas ao lado das intemporais Anas.
O mais curioso é que apesar destes nomes terem inspirado os paizinhos depois de assistirem às novelas brasileiras, sou a única a recordar-me que Odorico deve ser acompanhado de Paraguaçu e não de da Pordenone, um certo viajante italiano que chegou no século XIV a Pequim, segundo consta das aulas de China Imperial e Contemporânea. Para mim, Odorico só há um, o prefeito de Sucupira do Bem Amado e mais nenhum.
E que dizer quando passa um filme de Nagisa Oshima numa aula de Cinema Asiático e não consigo explicar a nenhum dos pitinhos a tourada que foi quando do mesmo realizador passou Império dos Sentidos na RTP2 nos anos 80. Depois de ver os beijinhos bem disfarçados dos amantes nos Contos Cruéis da Juventude, ninguém me acreditou que o mesmo fulano fosse capaz de filmar cenas de sexo explícito. Não tentei sequer abordar a questão do corte do instrumento do japonoca, muito menos falei em ovo. Pior, mesmo que tentasse, ninguém ia entender porque é que todos os portugueses, em especial os padres, falaram no assunto. Melhor, falaram muito mal do assunto.
A descobrir em breve mais curiosidades na diferença.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

O Que é a Ásia?

Esta não é a resposta para um milhão de dólares, nem sequer para 20 valores.
Longe disso.
O conceito de Ásia, sei-o agora um pouco mais claramente, é bastante complexo.
A resposta de que é um continente está longe de ser verdadeira, pois o mais acertado é falar-se em continente Euro-Asiático, Europa e Ásia numa só placa tectónica.
Utilizar-se a expressão Oriente servirá apenas para termos como contestação “a oriente do quê?” Nós, europeus, esquecemo-nos de que não somos / estamos no centro do mundo. Aliás, a China é que é conhecida como o Império do Meio, e a representação do globo por aquelas paragens é, aos olhos dos ocidentais, um mapa nada familiar e bastante confuso.
Chegamos, então, à conclusão (não definitiva, não única) de que a Ásia é mais uma convenção política, um caminho para nós ocidentais enquadrarmos algo numa categoria – o que é bem nosso, sendo que os asiáticos ali para os lados da China não têm esta preocupação de categorizar as coisas.
Este conceito de Ásia, criado por nós europeus e dominado por uma visão eurocentrica, não se entende sequer quanto à delimitação das suas fronteiras geográficas e dependerá muito do momento em que falamos da Ásia.
Hoje, quando pensamos e discutimos a adesão da Turquia à União Europeia, fará sentido incluí-la no “continente” asiático?
Pensaremos na Ásia como sendo não católica? Então porque é que a Geórgia está nela integrada?
E Chipre, Israel, Cazaquistão e outros ãos jogam as competições europeias de futebol a que título?
E o Egipto é África ou Ásia? E com esta, confundamos ainda mais as coisas com a questão árabe / Médio Oriente (mais uma vez, “médio” para quem?) / muçulmana, como se tudo fosse a mesma coisa.
As questões culturais e sociais que normalmente nos vêm à cabeça para traçar uma fronteira imaginária entre a Europa e a Ásia farão assim sentido? Sim, mas esse sentido será diferente para cada um de nós e diferirá também no tempo.

domingo, 27 de março de 2011

Estudos Asiáticos

Porquê a escolha do curso de Estudos Asiáticos aos 35 anos?
Em primeiro lugar, a vontade constante de aprender, conhecer, trocar impressões se possível fôr - e tem sido possível, sim senhora.
Depois, tinha de ser um curso ligado às Letras, às Humanidades, de preferência na Faculdade de Letras de Lisboa, perto de casa, mais real de conciliar com o trabalho.
A possibilidade de aprender línguas também foi cativante.
A América do Sul é a minha região de eleição, a que mais me interessa e a que melhor conheço (excluindo a Europa, por razões óbvias).
Mas em 2010 como que senti que fechei por momentos um ciclo de viagens por aí.
Desejo agora apontar baterias preferencialmente pela Ásia, donde apenas conheço algo da Turquia, Vietname e Camboja.
Nada mais lógico, pois, do que procurar dedicar-me à teoria deste continente, enquanto não o percorro na prática.
Neste blogue tentarei publicar sobre os temas que vou aprendendo na faculdade e tudo o mais que surgir sobre diversas questões sobre este diverso continente.