sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Death Note


Nestas férias lectivas de verão deu para me dedicar, pela primeira vez, a assistir anime japonesa.
Comecei por Michiko to Hatchin, recomendado por quem, como eu, gosta do Brasil e das batidas brasileiras. Mais feminina, ou não fossem as duas personagens principais uma mulher e sua filha, esta série lida, todavia, com um enredo cheio de maviosos e crime de rua. Mas com um cenário tropical, a lembrar efectivamente os morros e praias do Rio. Com o Japão acho que só tem mesmo a ver com a língua.

Depois assisti ainda ao Golden Boy, cerca de 6 episódios de comédia ligeira com o personagem que vai seguindo viagem e trabalhando no que aparece. Boa disposição, mas nada mais além.


Do que gostei mesmo e fiquei viciada, a ponto de só parar quando cheguei ao 37 e último episódio, foi do Death Note. Baseado num manga, conta a história de um aluno brilhante, Raito Yagami, que descobre um caderno onde bastará escrever o nome de alguém a quem se conhece o rosto para que esse alguém morra. Dá até para escrever as condições da sua morte. Ai o rapaz torna-se no mais do que perseguido Kira. O interessante nesta história é como um propósito que à partida talvez pudesse ser bom - o de limpar a sociedade dos criminosos - vai redundar num poder abissal, em que os homens passam a fazer de Deus e decidir quem deve ou não viver. Noções de bem e mal, misturadas com a vontade de fazer justiça pelas próprias mãos, o saber o que é a própria justiça, um anime que vai muito dentro das questões deontológicas e psicológicas.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Cultura Japonesa

O Japão enquanto país unificado não é uma ideia muito antiga, mas existe presença naquele espaço desde há cerca de 10000 anos. Durante a época glaciar estava ligado ao continente, daí que os seus primeiros habitantes tivessem ido para lá a pé. Só posteriormente se tornou um arquipélago. Desde sempre, no entanto, sofreu influências da Coreia e da China.
Apesar de o budismo ter tido uma forte implantação e ter sido essencial para a centralização institucional do país, com marcantes influências nas artes visuais, o shintoismo é a religião nativa, rica em mitologia. A adoração dos kami – que pode ser tudo o que nos rodeia – faz desta uma religião politeísta, onde a natureza é rainha. Desde cedo a mitologia nativa nos disse que a deusa do sol, Amaterasu, garantiu o mandato à família imperial para reinar eternamente. E é isso que tem acontecido até aos dias de hoje.
O que acontece é que se foi verificando ao longo do tempo uma tolerância religiosa, com uma pacífica convivência do budismo e do shintoismo, complementando-se no seu amor simples e directo pela natureza e suas forças reprodutivas.



Como épocas mais belas e pujantes em termos culturais temos, primeiro, a época Nara (710 a 784), onde apareceram os primeiros registos escritos, o Kojiki e o Nihon Shoki, com mitos, lendas e história. Ao nível da poesia deu-se o primeiro florescimento com a antologia Man´Yoshu. A waka, forma poética, já marcava presença, com o seu amor romântico e dedicação à natureza, buscando nesta a beleza, no que é frágil, fugaz e efémero.



O período Heian (794 a 1185) foi dos mais belos. Nestes tempos foi criado (ou evoluído) o silabário Kana, donde resultou uma mais fácil expressão dos sentimentos e pensamentos. No entanto, o enamoramento pela civilização chinesa persistia. A poesia continuou a florescer, mas foi a prosa, com os monogatari e os nikki que deixaram marcas. Os monogatari são os contos, de que o Genji Monogatari, da lady Shikibu Murasaki, é o maior exemplo, considerada ainda hoje uma das obras literárias mais importantes e famosas de todos os tempos. Os nikki são os diários. As mulheres entraram na rota da literatura e expunham a vida na corte, as suas cerimónias, o vestuário utilizado, os passatempos elegantes a que se dedicavam, fazer versos, as intrigas amorosas. Em resumo, desenvolveram (homens e mulheres) a arte de escrever. Por esta altura cresceu também uma classe guerreira nas províncias e viu-se a ascensão de clãs que vieram dominar a família imperial.


Seguiu-se o período Kamakura (1185 a 1333), tempo dos samurais com valores opostos aos da corte Heian. A valentia na luta, os homens que servem, a lealdade ao seu senhor, o truculento orgulho na linhagem familiar. Foi também o tempo das invasões mongóis, dominadas pelos kamikaze (os ventos divinos) do shinto. O budismo zen apareceu influenciado pelo budismo chan da China. A meditação levaria à iluminação. E a auto disciplina e o controle eram bem apropriados para a classe guerreira japonesa. Por outro lado, este tempo de guerra, conflitos e pessimismo levavam a que a religião fosse mais procurada.


O período Muromachi Ashikaga (1336 a 1573) continuou a ser tumultuoso. Mas, curiosamente, em termos culturais mostrou uma sensibilidade extrema. É deste tempo a construção do Pavilhão Dourado. Assim como é deste tempo a criação do teatro No, a cerimónia do chá, a pintura monocromática, o paisagismo com os seus jardins zen, o arranjo de flores. Enfim, todos eles parte constituinte de uma cultura zen onde o gosto pela estética, pela simplicidade, pelo imperfeito e pelo austero dominavam. A ênfase era colocada na sugestão, nunca na representação de algo de forma directa, uma vez que, entendia-se, a alusão levava à meditação. No fundo, havia a necessidade de criar momentos de beleza para contrabalançar o estado de guerra.



Por exemplo, os jardins zen pretendiam representar um lugar da natureza. Para isso recorria-se ao uso de pedras para representar as formações naturais e as estruturas criadas pelo homem, como montanhas, quedas de água, pontes. E ao uso de areia e de seixos brancos para representar a água. O objectivo era aludir à natureza, sendo que a sugestão levaria à meditação.

Houve, depois, um período de Unificação (1568 a 1600) em que os shoguns ficaram sem poder e os daimyos foram para os vassalos com as rebeliões de camponeses. Emergiu uma nova classe de daimyos e o Japão ficou sob o controlo destes. Por esta época continuaram a chegar os europeus e a sua cultura namban (estrangeira, bárbara). Os portugueses haviam chegado em 1543 a Tanegashima, Kyushu).




O período Tokugawa, ou Edo (1600 a 1867), foi um período de paz e de florescimento de uma cultura burguesa urbana. Os grandes senhores japoneses optaram por uma política de isolamento para preservar a hegemonia nacional. Havia uma proibição dos japoneses deixarem o país e severas restrições de relações com os outros países. Os missionários já tinham sido expulsos e apenas os holandeses foram autorizados a continuar o comércio, mas a sua actividade foi restrita a Nagasaki. A prosperidade desta época beneficiou os homens da cidade, como artesãos e comerciantes. Deu-se um revivalismo do confucionismo, ligado a um maior humanismo. Observou-se ainda a uma propagação da aprendizagem e da literacia entre todas as classes. Os samurais pareciam conformados em praticar as artes em vez da guerra, com uma grande procura do conhecimento e inclinação para passatempos elegantes, os quais passaram a ser generalizados e não apenas encarados como actividades sérias para levar a uma iluminação budista. Duas ideias floresceram: prazer e entretenimento. O teatro kabuki desenvolveu-se, assim como o bunraku (marionetas). A pintura Ukyo-E, as imagens do mundo flutuante com impressão em xilogravura, mostravam dois novos interesses: as mulheres e os actores do kabuki, mais sensuais e demonstrativas da emoção do artista. Realce para os pintores Hokusai e Hiroshige e as suas paisagens. Eram também tempos da geisha, a acompanhante, ou “pessoa para satisfação”, com talento para cantoras, dançarinas, contadoras de histórias e conversadoras. Supostamente eram estritamente entertainers nestas áreas.



Veio, então, a Restauração Meiji (1868 a 1912). O isolamento do Japão tornou-se insensato e insustentável. A China havia sido derrotada nas guerras do ópio e o Japão viria a seguir nos esforços dos estrangeiros para a abertura das terras do Oriente. Assim, sob as ideias do pragmatismo e da modernização, ou seja, com um respeito pela superioridade material do Ocidente como forma de protecção das ameaças de fora e com medidas tendentes à ocidentalização da sociedade, incluindo a modernização das forças armadas, o Japão entrou numa nova era. Foram abolidos os feudos e a classe samurai e estabelecida a igualdade para todas as pessoas. O viajar para o estrangeiro foi estimulado, assim como passaram a surgir convites a estrangeiros para virem ao Japão, sobretudo professores e conselheiros técnicos. Marcas ocidentais começaram a aparecer por todo o país, incluindo roupas ocidentais, cortes de cabelo, adopção do calendário solar, descanso ao domingo, introdução do Natal.
O período Taisho (1912 a 1926) viu emergir uma verdadeira cultura popular de massas. A rádio contribuiu para a difusão da cultura. Eram tempos de algum individualismo. A literatura era marcadamente proletária (o PC japonês havia sido criado em 1922) e no cinema viu-se a introdução da figura do benshi, o narrador que expressava as emoções que se viam na tela.

Mais tarde os militares avançaram para o poder e o fascismo e o ultra nacionalismo tomaram conta do país. A entrada na guerra e consequente derrota trouxe marcas. Não apenas a ocupação estrangeira, o pós guerra revelou um país exausto espiritualmente, com vidas desestruturadas. A literatura entretanto surgida retratava isso mesmo, em especial com Dazau Osamu e a sua literatura mais pacifista e anti guerra, com Junichiro Tanizaki e o seu grupo dos dissolutos e decadentes. Yasunari Kawabata escrevia sobre a “pobre beleza do Japão”. O cinema foi igualmente marcante, com Ozu, o mais japonês dos cineastas, a retratar o conflito entre o tradicional e o moderno resultante da mudança das relações nas famílias japonesas (Tokyo Monogatari, Uma Pousada em Tóquio); Mizoguchi, o mais romântico, preocupado com questões sociais (Ugetsu – Contos da Lua Vaga) e Kurosawa, o mais ocidental, criador do magistral Ikiru – Viver.
Hoje, o Japão que sempre soube aceitar as influências vindas de fora, adaptá-las e torná-las suas, possui uma cultura admirada e exportada para todo o mundo.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

O Meu Japonês

No aeroporto de Delhi, à partida para Varanasi, estava um grupo de japoneses que não entendiam nada de inglês. De hindi não sei se entendiam, mas da minha parte nesta matéria só me aventurarei no futuro. Breve, espero.
Resolvi meter conversa com uma japonoca.
E digo: a mana ficou surpreendida por me ver e ouvir ali desenvolta.
E digo mais: falar do tempo quando não se tem mais nada para falar é redentor. Viva o “totemo atsui” (traduzindo para essa imensa minoria que ainda não se dedicou ao estudo da língua “está muito calor”).
Afinal o meu japonês ainda dá para alguma coisa mais do que ir passando semestres.

O 4.º semestre

O 4.º semestre não foi muito melhor do que o anterior.
As notas uma treta.
O Japonês 4 penoso, mas ainda positivo. Obrigada Kioko.
Ásia na Globalização, uma cadeira partilhada com o IGOT (Instituto de Geografia e Ordenamento do Território), uma desilusão. Um caderno inteiro para ler só com globalização de um ponto de vista económico. E muito pouco de Ásia.
A cadeira de opção livre escolhida foi Cinema e Literatura. Boa aposta. Interessante assistir e ler autores intemporais a que ainda não me tinha dedicado. Sempre bom rever Almodóvar e melhor ainda relacioná-lo com assuntos que nunca me ocorreriam, não fosse o acompanhamento de uma Professora com P grande.
Mas porque este é um curso asiático, voltemos à Ásia e a este semestre.
Do que gostei mesmo foi de estudar a Cultura do Japão, merecedora de um post autónomo.

domingo, 22 de julho de 2012

The Best Exotic Marigold Hotel


Nem de propósito.
Anda agora aí um filme, "The Best Exotic Marigold Hotel", baseado num livro, que relata a aventura de uns reformados ingleses que por um ou outro motivo resolvem ir para a Índia e instalar-se no dito hotel.
Dá nos uma boa imagem da reacção que nós, ocidentais, temos quando nos confrontamos com a mítica mas real Índia.
A certa altura diz-se no filme "estou no inferno" e "no início assusta".
Mas ouve-se também "pode haver outro lugar no mundo que assalte de tal forma os sentidos?" ou "escândalo de ruído e cor".
Vê se também o abanar típico da cabeça para dizer sim, mas que nos deixa na dúvida se é efectivamente um sim ou um não. Ou um talvez.
Mas o que mais dá gosto de ouvir e de acreditar é o "na India costumamos dizer no fim, tudo dá certo, portanto, se não deu certo é porque não chegou ao fim".


A Índia e Eu


À partida para a minha primeira viagem à Índia, desconfiava que não seria fácil. Hoje, já de volta, posso confirmar que foi o local mais difícil onde já estive. Difícil no sentido de uma não imediata adaptação.

Chegámos a Delhi pela hora do almoço, depois de uma longa viagem com uma noite passada no avião. Sem tempo para qualquer repouso, saímos para o acto de comer logo num dos mais típicos restaurantes da Velha Delhi, o Karim's. A comida era o que mais receava. Também se confirmou fazer sentido esse receio. Com o calor de mais de 40 graus há lugar à vontade de comer tudo menos comidas quentes e condimentadas. Mas não vimos grande saída neste primeiro dia. O mais incrível é que, de forma racional ou inconscientemente, não deu vontade de comer (uma semana depois, já totalmente adaptadas, dava vontade de comer todas as saborosas comidas que nos punham à frente).

Aqui temos pois as duas grandes dificuldades: calor e comida.

E quanto ao demais?

A comunicação é fácil, uma vez que praticamente todos trocamos umas palavras de inglês. O pior é quando perguntamos algo e nos respondem "yes" ao mesmo tempo que abanam a cabeça de uma forma singular que estamos mais perto de assumir como um talvez. Do género, "Tem quartos? Yes"  Então porque continuas a abanar a cabeça para baixo para a esquerda para cima para a direita?

Na estrada, ou nos passeios que não existem, a confusão é total. Não bastasse já a falta de hábito de conduzir e ser conduzida à esquerda, mais parece que o sentido único é ocupar qualquer espaço da estrada. Atravessar as estradas é um acto familiar e não muito complicado depois de se tentar, primeiro, atravessar as ruas de Roma - brincadeira de crianças -, depois, tentar chegar ao outro lado nas ruas das cidades do Vietname - missão impossível ao inicio, sensação de que tudo se pode ao final. Na Índia que visitamos é mais tentar perceber o que se deve contornar primeiro, se o carro, o auto-riquexó, o táxi bicicleta ou a vaca. O segredo, em qualquer dos casos, é entrar na estrada de forma determinada e esperar que sejam os outros a contornarem-nos. E resulta.

Verdadeiramente pior é a experiência de ser conduzida num auto-riquexó (vulgo tuc-tuc). Pior ainda só ir num táxi bicicleta. Aqui, aos sustos permanentes de que algo motorizado, ou uma vaca, irá contra nós, temos de nos debater com o sentimento muito pouco humano de vermos um da nossa espécie a alancar fisicamente connosco. Às duas ao mesmo tempo. Mas até podem ser mais, que a troco de umas poucas rupias tudo se consegue.

Contrariadas, aproveitamos a pujança física de um moço local para nos transportar por cerca de 3 / 4 quilómetros, quando 3 / 4 auto-riquexos nos recusaram transporte, sem que encontre explicação até hoje para tal atitude a não ser o querer evitar o trânsito caótico no caminho que pretendíamos tomar (e aqui a bicicleta deu mesmo jeito, pela forma laboriosa como se esgueirava pelas ruelas mais libertas).

Em relação aos indianos, para além de já ter tido oportunidade de referir que os acho bonitos, são também de trato fácil. Há que acrescentar, todavia, que quando respondi a um taxista que eles eram friendly (amigáveis), não mais cessamos de ser aldrabadas. Por exemplo, apesar de estarmos a menos de 1 km de distância das lojas de comércio do governo em Delhi, levamos mais de um dia a chegar lá, pois antes tivemos de visitar umas quantas lojas amigas do amigável taxista indian.

Outro exemplo, no dia seguinte tínhamos encontro marcado com o Raj Gath, jardim talvez friendly, não ficamos a saber. Outro amigável taxista contrariou por uma vez a pressa que todos metem quando toca a pisar o pé no acelerador e fez de tudo para pisar ovos e nos fazer chegar ao jardim mesmo à hora do seu encerramento. Só para, vejam que amigo, ter o prazer de nos conduzir de volta por outros recantos da cidade e receber mais umas quantas rupias pela jornada. Foi aqui que decidimos que voltaríamos ao hotel de qualquer forma menos com ele. Estávamos dispostas a caminhar mais de 5 kms por vias rápidas, já que os tais 3 / 4 taxistas nos deram a nega. Foi então que apareceu o moço da bicicleta e o nosso humanismo foi-se.

É inevitável enfiar um barrete sempre que se viaja. Mas o mais provável é que o barrete a enfiar tenha algo a ver com taxistas. O mundo é um só.

Mas friendly, friendly eram os lagartos do quarto do hotel de Agra que tinha reservado com antecedência. Parece que eles ficam só no tecto e nas paredes e não vêem ter connosco. Ok. Até consigo acreditar. Mas ter que sofrer a humilhação de ouvir que "isto é a Índia" dói.

Eu já suspeitava que não ia ser fácil. Tinha mesmo que confrontar esta que se acha uma viajante experiente e independente com essa realidade?



PS: não consegui acreditar que os friendly lagartos não viriam ter comigo durante a noite, acompanhados de outros amigos voadores, ainda para mais numa cama sem qualquer lençol para me cobrir. Paguei a noite reservada através da escolha budget da minha bíblia Lonely Planet e fui direitinha para um 5 estrelas para não ter de pensar em bichos. Uma falta de adaptação à realidade do outro que foi mais ou menos de 12 euros a 120 euros num espaço de poucos quilómetros.

Em compensação, uma conquista: numa rua estreita de Varanasi uma vaca estava estacionada languidamente e a babar-se toda a tentar, como nós, vencer o calor. Ao seu lado, no único espaço que restava, uma mega bosta. E a verdade, pasme-se, é que eu consegui seguir adiante por esta mesma rua.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Introdução às Literaturas Eslavas

Inscrevi-me em Introdução às Literaturas Eslavas (Russa, Eslovena e Polaca) como opção livre. Mas continuo sem entender por que o Russo não é opção como língua asiática (e o inglês era até este ano), quando se observa que a imensa Sibéria está em território que se convencionou chamar asiático.
Como grande parte dos escritores russos que se devem ler passaram por deportações na Sibéria, bom… é aí que encontro sentido nesta escolha. Isso e o facto de ser uma apaixonada por Dostoievski e por aquilo que ele consegue manejar nas nossas cabeças. Li finalmente o Capote de Gogol, mas o bom é que o fiquei a conhecer melhor e a entender aquela sátira e aquele gozo com o funcionariozinho comum, não esquecendo, assim como Dostoievski não esquece, de nos apresentar as ruas de São Petersburgo, inóspitas, escuras e ventosas.
E fiquei a conhecer Lermontov, poeta que se dignou escrever a soberba prosa de “Um Herói do Nosso Tempo”. Isso devo-o à professora indiana que ensina língua russa e a sua literatura. Fiquei apaixonada por este autor que nos deixou a história do anti-herói Pechorin, um fulano do meio do século XIX igual a tantos outros sacanas bem parecidos e bem considerados que encontramos por aí quase 200 anos depois. E fiquei curiosa por ler Goncharov e o seu “Oblomov, o magnifico preguiçoso”, sobre um fulano que não saia da cama e até para sonhar tinha preguiça. Não chego a tanto, que sonhar é bom, mas acho que vou gostar de Goncharov e seu Oblomov.
Ai os clássicos russos, tanto para ler, para além dos citados, Puschkin, Turgenev, Tolstoi (tenho de ler a sua Anna Karenina), Mayakovski. Com tantos nomes fantásticos com centenas de anos, não é de estanhar que tão poucas aulas não nos tenham permitir chegar aos contemporâneos. Esses terei de descobrir por mim, depois de ler os seus papas.
De literatura eslovena fiquei a conhecer algo de France Preseren, o Camões esloveno, e sua influência para a cultura e identidade do país que ainda não era país. Outro nacionalista (no sentido de tentar valorizar a cultura e identidade eslovenas) que adorei ler foi Ivan Çankar e o seu “A Justiça de Yerney”. Esta obra de 1907 é de uma actualidade aterradora. Um trabalhador, depois de uma vida inteira a trabalhar como caseiro, é corrido pelos herdeiros do seu anterior patrão e sai em busca de compreensão por parte de alguém. Parte a pé, por caminhos que o levem até ao centro do poder, nessa altura dominado pelo império Austro-húngaro, sem que ninguém, então como hoje, lhe desse ouvidos, se preocupasse com a injustiça de que era alvo. Volta à casa, perturbado, e rebela-se, ateando-lhe fogo. Fim. Será que Çankar previu algo?
Quanto à literatura polaca, infelizmente, fui forçada a faltar a umas quantas aulas e não me entreguei à leitura de nenhum autor. Situação a merecer atenção, uma vez que ainda para mais a Polónia tem uma série de autores Nobel.

Culturas da China

As Culturas da China foram dadas por um professor a sério, daqueles que se vê terem gosto em saber e em passar esse saber. E não é nenhum cota, pelo que se espera que muitas mais gerações possam com ele aprender. O Barrento fala com o mesmo entusiasmo de Confúcio, de budismo e de taoismo como o faz do vestuário, da alimentação, da sociedade chinesa, passando pela análise do papel dos homens e das mulheres nessa mesma sociedade.
Como está bem de ver pelos posts anteriores, filosofias e pensamentos não são comigo. Mas temas da sociedade sim. Ficar a saber que aquele uniforme que Mao usava – e com ele todos os demais, homens ou mulheres, como se um vício de vestuário se tratasse – era uma adaptação de um outro lançado na ribalta por Sun Yat-sen, o pai do republicanismo na China, e que esse fato tinha influências do uniforme estudantil do período Meiji do Japão, do uniforme militar alemão e de vestes ocidentais, isso explica muita coisa, e não é apenas um detalhe.
China fechada? China adormecida? China inferior? Pois, grande conversa. Em todos os períodos da história se observou momentos de domínio de uma ou de outra civilização e a China esteve quase sempre por cima. O “império do meio”, como eles se chamam, a “Catai” de Marco Polo, sempre seduziu todo o mundo. A invenção do papel moeda foi lá (ainda que o capitalismo seja arte de outros), a bússola idem (ainda que nos compêndios ocidentais tenham sido os europeus – olá Portugal – a descobrir o mundo para além da Europa) e a pólvora apareceu também por lá (se bem que os chineses não a tivessem levado a sério e tenham visto os ingleses a bombardeá-los com a sua invenção na sua própria casa). Esta humilhação foi na segunda metade do século XIX, há cerca de 150 anos, e custou a ser ultrapassada. Veio a queda do regime imperial e instauração da república em 1912. Nacionalistas e comunistas em guerra civil umas décadas depois e eis que em 1949 chega a actual República Popular da China, criada por Mao. E depois, bom, depois há opiniões e posições para todos os gostos, mas o certo é que hoje a China com o seu socialismo de mercado é falada por cá por comprar a EDP e a REN.
Tenho de arranjar horário rapidamente para ir aprender chinês, a ver se os ppdocas têm um lugar para mim dentro do meu país.

O 3.º semestre

No semestre que agora acabou (o meu terceiro nos Estudos Asiáticos) não fui muito produtiva. 
Inscrevi-me nas Filosofias da Ásia, aturei o Paulo “PAN” Borges naquele tom monocórdico, absolutamente controlado, sem ponta de emoção, rosto rígido, boca idem, não vá um mosquitinho passar e ele sem querer mandar-lhe uma baforada e contribuir para o seu passamento. Budismo, é disso que se trata. E um pouco de jainismo, hinduísmo e mais uns quantos ismos asiáticos. Não me dignei apresentar-me aos exames porque esta conversa não é bem dirigida pela minha leve cabeça.
Inscrevi-me em Culturas da Índia, mas aí a história foi outra. Mudaram as aulas para o sábado, para outra Faculdade, com o rei Luís Filipe Thomaz. Como já estava metida num outro curso no mesmo dia, comecei a frequentar as aulas tarde e ainda me dei ao luxo de gozar uns merecidos fins-de-semana fora. Resultado, com muita pena minha assisti apenas a metade das lições. Porque foi mesmo disso que se tratou, de autênticas e interessantíssimas lições. Ouvido por Thomaz o budismo – originário da Índia – entranha-se melhor, embora se continue a estranhar. Mas acabei por não ir também a exame desta cadeira porque neste momento estou absolutamente arrasada, preciso de olhar para leituras só para prazer e não por necessidade.
Sobrou, assim, avaliação em apenas três cadeiras: o Japonês 3, as Culturas da China e a Introdução às Literaturas Eslavas.
Quanto ao japonês, e a acrescer ao “daitai”, mais ou menos, dizer que cada vez sei mais palavrinhas, mas cada vez tenho mais dificuldade em misturá-las, tipo mandá-las todas para um caldeirão, mexê-las, adicionar-lhes as especiarias necessárias para que daí possa sair algo de útil. Mas tenho de chegar ao nível 6 custe o que custar, como agora está na moda dizer.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

daitai

O estado do meu japonês é o seguinte:
watashi wa nihon go ga daitai wakarimasu
Para os que ainda estão pior do que no que a língua japonesa diz respeito, traduzo: eu falo japonês mais ou menos
e já não é mau