sexta-feira, 27 de março de 2015

One's Company e Journey to a War

Dois livros sobre este período da história chinesa da década de 30.


Peter Fleming escreveu One's Company: A Journey to China, um livro de viagens sobre os sete meses de 1933 que passou na China. Embora faça questão de esclarecer que a China é demasiado grande, populosa e variada para que esses meses façam dele um entendido na matéria, este não deixa de ser um relato muitíssimo valioso desta época, cheio de apontamentos irónicos.
A obra está dividida em dois capítulos, um primeiro dedicado ao Machukuo, o estado fantoche criado na Manchuria pelos japoneses, e um segundo dedicado à China Vermelha, numa altura em que a mobilização comunista estava em marcha e os nacionalistas se iam defendendo.


Journey to a War é também um livro de viagens publicado nos anos 1930'. W.H. Auden e Christopher Isherwood oferecem-nos uma obra em verso e prosa. Encontramos aqui poemas de Auden sobre a jornada desta dupla na China em 1938, um diário de viagens de Isherwood sobre essa mesma jornada e as observações de ambos acerca da Guerra Sino-Japonesa. Ainda, uma série de fotografias de Auden.

quinta-feira, 12 de março de 2015

Manchukuo


O estado de Manchukuo, criado em consequência da ocupação japonesa na Manchúria, seguia uma ideologia confucionista. O "caminho real", ideia de Mêncio - governo pelos que detinham a força e governo pelos que eram legitimados pelo céu - era o postulado dominante. Antes esta região era controlada por senhores da guerra que detinham a força; agora era controlada por um governo legítimo. Seguiam uma ideia de progresso, mas utilizando uma ideologia conservadora chinesa.
Este estado pretendia demonstrar que era o resultado da vontade popular - o que era difícil, pois não só não havia uma história de reclamação da sua independência, como a maioria da população era han (a etnia maioritária na China). Este era um estado fantoche, na medida em que as decisões eram tomadas em função dos interesses japoneses. A governação era seguida em grande parte pelos japoneses, havia peritos do Japão na administração pública e a Companhia de Caminhos de Ferro do Sul vêm a exercer as suas funções em todo o território, bem como o Exército de Guandong.
O Manchukuo estava subordinado ao estado japonês - de acordo com o "novo imperialismo" era um estado independente, mas governado na prática por um estado novo imperial - o Japão.
O Japão utilizou no Manchukuo um modelo que pretendia vir a desenvolver em toda a Ásia. Daí a propaganda acerca do Manchukuo: "o pomar do mundo", "todos vivem em paz", "o paraíso de um novo país, de um novo povo", "paraíso dos antepassados" - ideia de nação.

Depois da instituição da República na China, em 1912, optou-se por preservar o imperador, como forma de pacificação. O imperador não tinha poderes políticos, mas era pago pelo Estado chinês para que mantivesse o seu estilo de vida, incluindo a residência na Cidade Proibida e Palácio de Verão. Esta situação permaneceu até 1924, data em que o imperador foi expulso. Puyi passa a viver na concessão estrangeira japonesa de Tianjin como forma destes estreitarem os seus laços com os manchus. Os japoneses concordavam com um estado manchu, mas não que fosse restabelecida a dinastia Qing. Um compromisso foi alcançado e em 1934 foi dado a Puyi o título de imperador do Manchukuo.

Ao contrário do que refere muita da historiografia chinesa, segundo a qual houve uma resistência generalizada à ocupação japonesa, tal não terá sido assim. Pelo contrário, é certo o colaboracionismo generalizado das elites locais. Esta situação deveu-se à política de não resistência do KMT, com encorajamento do colaboracionismo, e à oposição a Zhang Xueliang, o senhor da guerra local, em virtude da sua aplicação de recursos económicos em meios militares para conquista da supremacia nacional. Por outro lado, havia um saudosismo relativamente ao estado imperial chinês e sentia-se que se tinha entrado no caos com a república. Ou seja, a ideia era a de que o modelo imperial era aquele que deveria ser seguido e que a ligação aos japoneses era necessária para a longo prazo se criar uma sociedade estável. Não obstante, os meios usados pelos japoneses também forçaram esse colaboracionismo, quer com a actuação pela força, quer através da persuasão de projectos sedutores de bem estar social e redução fiscal.

quarta-feira, 4 de março de 2015

Seria Mao inovador ao colocar os camponeses no centro da sua manobra?


A historiografia ocidental começou por se centrar na "tese maioista", segundo a qual o pensamento de Mao não era ortodoxo, pois ao falar dos camponeses, ao invés do proletariado, seguiu por um caminho diferente daquele seguido pelos influenciados pelas doutrinas soviéticas. Fairbank apontou que essa diferença de Mao se verificava pelas próprias circunstâncias da China, sendo, pois, normal que Mao seguisse orientação distinta. Um seu pupilo, Benjamim Schwartz, utilizou pela primeira vez o termo "maoismo" em 1951, afirmando que Marx e Engels não haviam pensado num papel criativo dos camponeses numa revolução e que Lenine apenas pensou nos camponeses como auxiliares do proletariado revolucionário das cidades.
Já outros pensadores, porém, recusam a originalidade de Mao e apontam a "lenda do maoismo". Karl Wittfogel defende que os camponeses têm no marxismo - leninismo um papel revolucionário fundamental, com papel na revolução burguesa anti-feudal, e já falavam mesmo na revolução no quadro das colónias e semi-colónias pré-capitalistas - a situação da China era uma de atraso em relação àquela pensada por Marx para o modelo socialista e, então, era vista como um destes casos. Dizem que, por outro lado, Lenine já tinha falado na importância de se dar atenção aos camponeses e de se criar sovietes de camponeses (para a Rússia) e que Estaline havia também falado da necessidade da criação de sovietes de operários e camponeses.

A Deusa


O filme "A Deusa" é uma obra prima do cinema mudo chinês e revela-nos aspectos de modernidade, embora seja dominado por uma mentalidade conservadora do papel atribuído à mulher.
Filme de 1934, Shénnǚ foi dirigido por Wu Yonggang. A actriz principal é Ruan Lingyu que tem aqui um desempenho ímpar e marcante. Tragicamente, a estrela chinesa viria a morrer não muito tempo depois. Uma vida infeliz, tal como a da mulher que representa neste filme - uma prostituta que trabalha para poder sustentar-se e ao seu filho. 
A modernidade é visível em grande parte do filme, desde logo nos seus momentos iniciais, onde a profusão de cabos e fios de electricidade e a luz e os neons nos mostram que eram tempos modernos os que se viviam naquela Xangai. Igualmente, quando a mãe-prostituta busca trabalho nas fábricas, as chaminés mostram-nos a dinâmica da urbe industrial moderna, já então assolada pelo desemprego.
Embora esta obra marcadamente da cena cinematográfica da esquerda de Xangai nos mostre uma mulher no seu papel tradicional de mãe, vemos igualmente uma mulher que já espera pouco da sociedade em geral e dos homens em particular e luta para conseguir dar ao seu filho um futuro melhor. Uma heroína, uma mulher no papel de mãe que tudo sacrifica pelo seu filho. No fim, obtém assim a salvação pelo sacrifício.