quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Cultura Japonesa

O Japão enquanto país unificado não é uma ideia muito antiga, mas existe presença naquele espaço desde há cerca de 10000 anos. Durante a época glaciar estava ligado ao continente, daí que os seus primeiros habitantes tivessem ido para lá a pé. Só posteriormente se tornou um arquipélago. Desde sempre, no entanto, sofreu influências da Coreia e da China.
Apesar de o budismo ter tido uma forte implantação e ter sido essencial para a centralização institucional do país, com marcantes influências nas artes visuais, o shintoismo é a religião nativa, rica em mitologia. A adoração dos kami – que pode ser tudo o que nos rodeia – faz desta uma religião politeísta, onde a natureza é rainha. Desde cedo a mitologia nativa nos disse que a deusa do sol, Amaterasu, garantiu o mandato à família imperial para reinar eternamente. E é isso que tem acontecido até aos dias de hoje.
O que acontece é que se foi verificando ao longo do tempo uma tolerância religiosa, com uma pacífica convivência do budismo e do shintoismo, complementando-se no seu amor simples e directo pela natureza e suas forças reprodutivas.



Como épocas mais belas e pujantes em termos culturais temos, primeiro, a época Nara (710 a 784), onde apareceram os primeiros registos escritos, o Kojiki e o Nihon Shoki, com mitos, lendas e história. Ao nível da poesia deu-se o primeiro florescimento com a antologia Man´Yoshu. A waka, forma poética, já marcava presença, com o seu amor romântico e dedicação à natureza, buscando nesta a beleza, no que é frágil, fugaz e efémero.



O período Heian (794 a 1185) foi dos mais belos. Nestes tempos foi criado (ou evoluído) o silabário Kana, donde resultou uma mais fácil expressão dos sentimentos e pensamentos. No entanto, o enamoramento pela civilização chinesa persistia. A poesia continuou a florescer, mas foi a prosa, com os monogatari e os nikki que deixaram marcas. Os monogatari são os contos, de que o Genji Monogatari, da lady Shikibu Murasaki, é o maior exemplo, considerada ainda hoje uma das obras literárias mais importantes e famosas de todos os tempos. Os nikki são os diários. As mulheres entraram na rota da literatura e expunham a vida na corte, as suas cerimónias, o vestuário utilizado, os passatempos elegantes a que se dedicavam, fazer versos, as intrigas amorosas. Em resumo, desenvolveram (homens e mulheres) a arte de escrever. Por esta altura cresceu também uma classe guerreira nas províncias e viu-se a ascensão de clãs que vieram dominar a família imperial.


Seguiu-se o período Kamakura (1185 a 1333), tempo dos samurais com valores opostos aos da corte Heian. A valentia na luta, os homens que servem, a lealdade ao seu senhor, o truculento orgulho na linhagem familiar. Foi também o tempo das invasões mongóis, dominadas pelos kamikaze (os ventos divinos) do shinto. O budismo zen apareceu influenciado pelo budismo chan da China. A meditação levaria à iluminação. E a auto disciplina e o controle eram bem apropriados para a classe guerreira japonesa. Por outro lado, este tempo de guerra, conflitos e pessimismo levavam a que a religião fosse mais procurada.


O período Muromachi Ashikaga (1336 a 1573) continuou a ser tumultuoso. Mas, curiosamente, em termos culturais mostrou uma sensibilidade extrema. É deste tempo a construção do Pavilhão Dourado. Assim como é deste tempo a criação do teatro No, a cerimónia do chá, a pintura monocromática, o paisagismo com os seus jardins zen, o arranjo de flores. Enfim, todos eles parte constituinte de uma cultura zen onde o gosto pela estética, pela simplicidade, pelo imperfeito e pelo austero dominavam. A ênfase era colocada na sugestão, nunca na representação de algo de forma directa, uma vez que, entendia-se, a alusão levava à meditação. No fundo, havia a necessidade de criar momentos de beleza para contrabalançar o estado de guerra.



Por exemplo, os jardins zen pretendiam representar um lugar da natureza. Para isso recorria-se ao uso de pedras para representar as formações naturais e as estruturas criadas pelo homem, como montanhas, quedas de água, pontes. E ao uso de areia e de seixos brancos para representar a água. O objectivo era aludir à natureza, sendo que a sugestão levaria à meditação.

Houve, depois, um período de Unificação (1568 a 1600) em que os shoguns ficaram sem poder e os daimyos foram para os vassalos com as rebeliões de camponeses. Emergiu uma nova classe de daimyos e o Japão ficou sob o controlo destes. Por esta época continuaram a chegar os europeus e a sua cultura namban (estrangeira, bárbara). Os portugueses haviam chegado em 1543 a Tanegashima, Kyushu).




O período Tokugawa, ou Edo (1600 a 1867), foi um período de paz e de florescimento de uma cultura burguesa urbana. Os grandes senhores japoneses optaram por uma política de isolamento para preservar a hegemonia nacional. Havia uma proibição dos japoneses deixarem o país e severas restrições de relações com os outros países. Os missionários já tinham sido expulsos e apenas os holandeses foram autorizados a continuar o comércio, mas a sua actividade foi restrita a Nagasaki. A prosperidade desta época beneficiou os homens da cidade, como artesãos e comerciantes. Deu-se um revivalismo do confucionismo, ligado a um maior humanismo. Observou-se ainda a uma propagação da aprendizagem e da literacia entre todas as classes. Os samurais pareciam conformados em praticar as artes em vez da guerra, com uma grande procura do conhecimento e inclinação para passatempos elegantes, os quais passaram a ser generalizados e não apenas encarados como actividades sérias para levar a uma iluminação budista. Duas ideias floresceram: prazer e entretenimento. O teatro kabuki desenvolveu-se, assim como o bunraku (marionetas). A pintura Ukyo-E, as imagens do mundo flutuante com impressão em xilogravura, mostravam dois novos interesses: as mulheres e os actores do kabuki, mais sensuais e demonstrativas da emoção do artista. Realce para os pintores Hokusai e Hiroshige e as suas paisagens. Eram também tempos da geisha, a acompanhante, ou “pessoa para satisfação”, com talento para cantoras, dançarinas, contadoras de histórias e conversadoras. Supostamente eram estritamente entertainers nestas áreas.



Veio, então, a Restauração Meiji (1868 a 1912). O isolamento do Japão tornou-se insensato e insustentável. A China havia sido derrotada nas guerras do ópio e o Japão viria a seguir nos esforços dos estrangeiros para a abertura das terras do Oriente. Assim, sob as ideias do pragmatismo e da modernização, ou seja, com um respeito pela superioridade material do Ocidente como forma de protecção das ameaças de fora e com medidas tendentes à ocidentalização da sociedade, incluindo a modernização das forças armadas, o Japão entrou numa nova era. Foram abolidos os feudos e a classe samurai e estabelecida a igualdade para todas as pessoas. O viajar para o estrangeiro foi estimulado, assim como passaram a surgir convites a estrangeiros para virem ao Japão, sobretudo professores e conselheiros técnicos. Marcas ocidentais começaram a aparecer por todo o país, incluindo roupas ocidentais, cortes de cabelo, adopção do calendário solar, descanso ao domingo, introdução do Natal.
O período Taisho (1912 a 1926) viu emergir uma verdadeira cultura popular de massas. A rádio contribuiu para a difusão da cultura. Eram tempos de algum individualismo. A literatura era marcadamente proletária (o PC japonês havia sido criado em 1922) e no cinema viu-se a introdução da figura do benshi, o narrador que expressava as emoções que se viam na tela.

Mais tarde os militares avançaram para o poder e o fascismo e o ultra nacionalismo tomaram conta do país. A entrada na guerra e consequente derrota trouxe marcas. Não apenas a ocupação estrangeira, o pós guerra revelou um país exausto espiritualmente, com vidas desestruturadas. A literatura entretanto surgida retratava isso mesmo, em especial com Dazau Osamu e a sua literatura mais pacifista e anti guerra, com Junichiro Tanizaki e o seu grupo dos dissolutos e decadentes. Yasunari Kawabata escrevia sobre a “pobre beleza do Japão”. O cinema foi igualmente marcante, com Ozu, o mais japonês dos cineastas, a retratar o conflito entre o tradicional e o moderno resultante da mudança das relações nas famílias japonesas (Tokyo Monogatari, Uma Pousada em Tóquio); Mizoguchi, o mais romântico, preocupado com questões sociais (Ugetsu – Contos da Lua Vaga) e Kurosawa, o mais ocidental, criador do magistral Ikiru – Viver.
Hoje, o Japão que sempre soube aceitar as influências vindas de fora, adaptá-las e torná-las suas, possui uma cultura admirada e exportada para todo o mundo.

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