sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Índia Moderna e Contemporânea

Os séculos XIII a XVI viram emergir no sub continente indiano uma série de reinos regionais. Nomes como Mahmud Ghazni e Muhammad Ghuri iniciaram o domínio turco e afegão, estabelecendo-se na região de Delhi, uma posição estratégica que lhes permitia o acesso quer ao Vale do Ganges como à Índia Central e Ocidental. O Decão seria, no entanto, o maior obstáculo à ideia de império.

A norte o sultanado de Delhi imperava, quer fosse com os Khaljis, Tughluqs, Sayyids ou Lodis, assistindo-se ainda a raids mongóis e timúridas. Ibn Batuta, o viajante marroquino do século XIV, passou por lá e relatou o que viu e viveu durante o reinado dos Tughluqs.

Mais a sul assistia-se à rivalidade entre os Bahmanidas, muçulmanos, e os de Vijayanagara, hindus. Famosa ficou a Crónica dos Reis de Bisnaga, por Domingo Paes, no século XVI. Este último reino atingiu um grande nível de urbanização, comercialização e monetarização e foram como que os predecessores do estado Maratha criado no século XVII. Ainda hoje a sua arquitectura pode ser apreciada em Hampi.


Até que em 1526 uma nova força toma Delhi e viria a formar um império que reinaria grande parte do sub continente, destronada mais tarde pelos britânicos, os quais, esses sim, haviam de estender o seu domínio a todo o sub continente. Os Mogóis viram o seu império fundado por Babur, após decisivas batalhas contra os afegãos. Reclamavam a sua ascendência de Genghis Khan e de Timur, dois grandes guerreiros. Sucederam a Babur o seu filho Humayun (em Delhi perdura ainda hoje o mausoléu que a sua mulher mandou erigir em sua memória, costume que atingiria o seu apogeu com o Taj Mahal) e o seu neto Akbar.

Akbar, o grande, nasceu na Índia sob protecção hindu. Para Akbar os indianos não eram uma massa inculta de infiéis que horrorizaram Babur, eram antes seus compatriotas. Nessa sequência, Akbar levantou medidas discriminatórias para com os hindus, como a taxa dos peregrinos ou a jizya, e tomou medidas liberais. Com ele começou a ser criado um império pan indiano, com os mogóis (muçulmanos) a assegurarem os serviços de uma respeitada elite e os rajputs (hindus) a ganharem acesso a altos graus. O seu reinado foi marcado pela tolerância religiosa e pela expansão. Com a conquista do Gujerate Akbar entrou em contacto com os padres portugueses.

O sucesso Mogol devia-se em grande parte à abundante força trabalhadora que gerava excedente, o factor da grande estabilidade do regime. Também o comércio internacional ajudou. O governo era autocrático e a opulência inimaginável.


A arquitectura atingiu níveis de excelência com a construção do Taj Mahal por Shah Jahan, filho de Jahangir, neto de Akbar. Com estes dois descendentes de Akbar assistiu-se a um período de paz interna, desenvolvimento económico e crescimento cultural.


Pelo contrário, com Aurangzeb (1658-1707) o império Mogol entraria em conflitos. Se por um lado atingiu a sua máxima extensão durante o seu reinado, foi com o último grande imperador Mogol que o conflito cresceu em diversas esferas: política, religiosa, com estagnação cultural e declínio económico. Aurangzeb, ao contrário dos seus antecessores, não gostava de ostentação e a sua vida pessoal era marcada pela simplicidade. Proibiu a construção de novos templos hindus e colocou ênfase na posição superior dos muçulmanos. Aventurou-se na conquista do Decão, derrotando os sultanados de Golconda e Bijapur, mas lá encontrou a difícil oposição dos Marathas, força regional hindu que vinha em crescendo no fim do século XVII.


Depois da morte de Aurangzeb entrou-se num período de guerras de sucessão, com a emergência de estados regionais e invasões estrangeiras. Os Marathas ganharam força, muito graças à instituição do Peshwa e sua visão centralista.

Mas seriam os ingleses a levar o centralismo a uma nova forma: a colonial.  

A sua ascensão, com a criação da Companhia das Índias Orientais, foi em grande parte motivada pelo crescimento exponencial do comércio no século XVIII, sobretudo pelo comércio com a China (seda e chá), depois pelos tecidos da Índia.

Há quem defenda que as conquistas britânicas na Índia foram fortuitas, que vieram a ocupar o vacum de poder derivado do declínio Mogol, não tendo havido nenhum regime nativo que emergisse para preencher este buraco. A autoridade fragmentada, bem como o declínio económico e a lei fraca quer de afegãos quer de marathas teriam ajudado. Mas há quem defenda ainda que esse caos e vacum teriam sido criação da Companhia das Índias Orientais. Reais eram as ambições expansionistas britânicas.

Foi estabelecida uma nova capital em Calcutá e houve que adaptar-se a uma realidade da qual pouco mais se sabia do que questões comerciais, sendo que os britânicos praticamente não se tinham aventurado para além dos enclaves costeiros. Assistiu-se a um certo interesse pelas matérias orientalistas, com o estudo de textos originais em sânscrito e arábico, e criação da Asiatic Society of Bengal em 1784.

Os britânicos procederam à organização de um eficiente exército militar, com recrutamento entre as mais altas castas de agricultores hindus, preocupando-se, assim, em acomodar as sensibilidades de casta e religiosas no exército.

Viria a assistir-se a um imperialismo agressivo, produto das vitorias britânicas sobre Napoleão, com cada vez mais e mais territórios incluídos no império britânico, inclusive os Marathas.

Os indianos foram confrontados com a modernidade e depois do interesse inicial pelo comércio este dará lugar à criação de estruturas políticas, judiciais e fiscais cada vez mais burocratizadas. Do ponto de vista económico, a revolução industrial que estava a acontecer na Europa leva a que as máquinas embarateçam os custos de produção,  tornando mais competitivos os produtos que se ia buscar à Índia. Do ponto de vista cultural, a admiração inicial pelas culturas indianas foi substituída por uma crescente imposição do inglês e da cultura inglesa, com defesa de uma educação à europeia para todos os povos. No que uns viam caminho rumo à modernidade, outros viam ingerência (como é o caso da abolição do sati - o ritual das viúvas indianas que se imolavam na pira do marido).


Em 1858 a Companhia das Índias Orientais foi abolida e a Índia passa a ser governada directamente pela Coroa até 1947, período este que ficou a ser conhecido como Raj. O fim da Companhia deveu-se à Revolta dos Cipaios, um motim indiano que não foi apenas um acto de soldados descontentes, antes a resposta a múltiplas queixas como as políticas culturais britânicas, a severidade da avaliação das receitas e a degradação das elites terratenentes e principescas. Para além de que ao exército composto por indianos era pedido que servissem fora da Índia (receio dos soldados de poluição por atravessar o mar e lidar com indivíduos de castas mais baixas). Mais, a introdução da nova espingarda Enfield, cujos cartuchos estavam revestidos por uma camada de gordura tanto de porco como de vaca, os quais tinham de ser abertos com os dentes, era ofensiva quer para muçulmanos quer para hindus.

Na realidade o poder britânico era frágil e havia que mudar algo. A Rainha Vitoria viria a ser aclamada como imperatriz da Índia em 1877 no Durbar celebrado em Delhi. As bases do novo sistema britânico eram as seguintes: fazer das famílias reais a elite natural da Índia, usando como modelo a sociedade da aristocracia inglesa, as quais teriam uma câmara própria; criação de novas estruturas administrativas; reforma nas estruturas militares.

Mas assistir-se-ia a uma transformação política na Índia com o aparecimento de uma corrente nacionalista, primeiro algo difusa e depois mais coerente. A imprensa foi importante para a luta do nacionalismo. Dá-se, então, início à contestação indiana face à presença britânica, através de uma elite nacionalista sobretudo urbana. Em 1885 reúne-se em Bombaim o primeiro Congresso Nacional Indiano, o qual verbalizou o descontentamento indiano como meio de exprimir as reivindicações nacionalistas indianas. A visão do Congresso insistia que os interesses do eu, casta e comunidade ficassem subordinados ao bem comum e à nação indiana. Nos primeiros tempos não questionou a continuação do governo britânico, queriam antes mais participação no conselho legislativo e uma genuína abertura do serviço civil indiano aos indianos. Pediam reformas. E desejavam trabalhar sobre a opinião pública. Mas não conseguem atrair os muçulmanos.

O movimento swadeshi, passado à Índia por panfleto, imprensa e boca a boca, representava unidade e uma acção efectiva materializada no boicote à indústria britânica, sobretudo aos têxteis, e boicote às instituições governamentais de ensino.

Após a I Grande Guerra Mundial, na qual os indianos participaram, o descontentamento cresce e os nacionalistas pedem o Swaraj, o auto governo.


Entra em cena pela primeira vez Gandhi e as suas campanhas de resistência pacífica, o satyagraha, ou força da verdade, mediante boicotes, petições e actos de desobediência civil.

Os britânicos, também cansados com a guerra, lançam mão de um sistema de diarquia, dividindo as funções do governo em dois, um pelo governo central em Delhi sob controlo britânico, outro pelas províncias com algumas áreas como agricultura e educação e taxas. Mas os britânicos cometem um erro crasso ao emitirem o Rowlatt Act em 1919,  prolongando as restrições às liberdades fundamentais, como a detenção e julgamento sem júri. Esta intenção de aplicar a continuação de um estado de excepção cria hostilidade entre os indianos. Em sequência de mais uma década de luta, com o recurso a movimentos de desobediência civil, os indianos deixariam de discutir o autogoverno para passarem a pedir a independência total, o Purna Swaraj. As próximas décadas seriam dedicadas tanto a evitar os britânicos e ajustar-se a um mundo pós-colonial, como a tentar decidir a futura composição política do subcontinente entre Congresso e Liga Muçulmana. A clivagem inter comunitária e religiosa acentuava-se e seria aproveitada pelos britânicos para dividir ainda mais. Ao contrário do Congresso, que possuía uma organização já implantada, os muçulmanos estavam dispersos por uma série de partidos e a Liga não só não tinha um programa político claro como também não tinha um líder incontestado. Até que apareceu Jinnah, que juntamente com o hindu Nehru seriam as grandes figuras da independência indiana e da criação dos dois estados impendentes que foram criados após a atabalhoada e apressada partição em 1947. O Quit India deu resultado e Nehru pode fazer o seu célebre discurso a 15 de Agosto de 1947:

"Long years ago, we made a tryst with destiny. Now the time has come when we shall redeem our pledge - not wholly or in full measure - but very substantially. At the stroke of the midnight hour, when the world sleeps, India will awake to life and freedom. A moment comes, but rarely in history, when we step out from the old to the new, when an age ends, and when the soul of a nation, long suppressed, finds utterance."

 

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